Postado em 04/06/2008
Brasil em sintonia
Em outros países, o conceito de sustentabilidade chegou à arquitetura há cerca de 15 anos, segundo Sílvia Manfredi. A arquiteta conta que, no Brasil, os primeiros projetos “verdes” têm sido executados há dois anos. “Nos últimos 5 mil anos, a arquitetura foi uma técnica usada para nos separar do espaço natural”, afirma o arquiteto José Wagner Garcia, um dos responsáveis pela ampliação do Centro de Pesquisa em Alta Tecnologia da Petrobras (Cenpes), na Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro. “Eram grandes massas e volumes de matérias que nos colocavam em um ambiente completamente artificial. Hoje, pensamos em um ambiente que dialogue com o natural.” O arquiteto diz que o projeto da Petrobras levou em conta, entre outros elementos, o material construtivo a ser utilizado, o tratamento das superfícies envidraçadas, o aproveitamento da luz e da ventilação naturais, os sistemas para uso racional da água, os materiais de baixo impacto ambiental e o emprego de tecnologias limpas. Segundo Garcia, as obras devem ficar prontas no fim do ano.
Na lista de projetos sustentáveis nos quais o arquiteto está envolvido estão ainda o edifício da marca italiana de automóveis Ferrari, na Avenida Brasil, em São Paulo, e uma torre em Dubai, nos Emirados Árabes, que será exemplo do que ele chama de ecodesign em eficiência energética. “O Brasil começou atrasado, mas pode estar na vanguarda da arquitetura sustentável”, analisa Garcia. “Temos muita massa intelectual e tecnológica, principalmente vinculada ao biodiesel.” De acordo com o profissional, esse know-how brasileiro no uso de energias renováveis será fundamental para a criação de um projeto, também da Petrobras, em plena Floresta Amazônica. O desafio será construir num ambiente hoje bastante frágil, reduzindo o impacto ambiental a praticamente zero. “Para isso, será implantada uma tecnologia de cultivo de biodiesel que possibilitará à construção ser auto-suficiente do ponto de vista energético”, explica Garcia.
A preocupação dos arquitetos que trabalham em bases sustentáveis, no entanto, é a banalização do conceito. Ou pior: o uso do termo para construções que, estruturalmente, não obedeçam aos requisitos. “Existe uma lista enorme [de itens a serem atendidos] para você poder chamar uma edificação de sustentável”, explica Joana Gonçalves, pesquisadora do Laboratório de Conforto Ambiental e Eficiência Energética da Faculdade de Arquitetura (FAU) da Universidade de São Paulo (USP), um dos pioneiros no estudo da sustentabilidade das construções civis. “O tema é complexo e existe muita coisa mercadológica e pouca coisa concreta”, finaliza.
• houver um estudo minucioso do terreno. Um projeto deve levar em consideração a topografia e a avaliação de resíduos no solo. São medidas importantes para que o edifício não seja construído em solo contaminado.
• o projeto previr estudo da luz solar no local. Com isso é possível utilizar energia solar e, por exemplo, diminuir o uso do ar-condicionado e de lâmpadas.
• houver estudo dos ventos. Saber de que forma os ventos vão atingir um edifício pode ajudar no aumento do conforto ambiental. Locais naturalmente ventilados tendem a dispensar o uso de ar-condicionado.
• possuir sistemas de reutilização de água.
• usar materiais sustentáveis. Quanto menos energia tiver sido consumida para a fabricação de um produto, melhor.
• mostrar soluções racionais no acabamento. Descargas e torneiras que racionem o uso de água e lâmpadas que consumam menos energia são pequenos ajustes que fazem grande diferença na hora de classificar um edifício como sustentável.
• considerar disposições arquitetônicas que protejam os usuários de incômodos acústicos, criando uma qualidade de ambiência acústica adaptada aos diferentes locais.
A sustentabilidade nas construções do Sesc São Paulo já era característica marcante muito antes de o tema entrar em voga. Em suas 31 unidades em todo o estado, o conceito da arquitetura de baixo impacto ambiental ultrapassa questões técnicas e envolve as relações humanas, trabalhistas e regimes de contratação – e, claro, respeitando também o reaproveitamento e destinação de resíduos e a conservação de recursos naturais, entre outros critérios. O engenheiro Luciano Ranieri, gestor da área de projetos da Gerência de Serviços de Engenharia (GSE) do Sesc explica ainda que, para considerar uma construção sustentável, o Sesc leva em consideração toda a cadeia que a envolve, desde a manufatura básica até as condições de transporte, passando pelos resíduos decorrentes dos processos de aplicação e seu destino, e pelas condições que vão envolver eventuais reformas e até mesmo uma demolição.
“Simplificando, é pensar em projeto de construção civil de forma ética e responsável”, esclarece. “Desde nossas primeiras construções adotávamos soluções para minimizar o consumo de água, por exemplo. Como válvulas instaladas no piso [dos banheiros] que, acionadas com os pés, resultavam em banhos sem desperdício.” A inauguração do Sesc Itaquera (foto), em 1992, é considerada um marco em mais essa ação do Sesc. Foi quando começaram a ser utilizadas torneiras de fechamento automático e com vazão controlada, chuveiros com temperatura pré-ajustada de acordo com as estações do ano e caixas acopladas de vazão reduzida para os vasos sanitários. “O consumo de energia e água naquele momento diminuiu aproximadamente 25%”, revela o engenheiro.
A partir de então, as inovações começaram a ser implantadas em todas as outras unidades, sempre com constante atualização das novas tecnologias. A partir de 1996, por exemplo, passou-se a utilizar o resíduo do calor dos sistemas de ar condicionado central para o pré-aquecimento das piscinas. “O sistema se mostrou tão eficiente que no período compreendido pelos meses de setembro a fevereiro [na época] 100% da energia necessária para o aquecimento da água das piscinas das unidades Vila Mariana e Pinheiros foi gerada dessa forma.”
Outras unidades também exemplificam a preocupação do Sesc com o impacto ambiental da construção de seus prédios e também de sua presença nas diversas cidades em que se instala. O Sesc Araraquara, inaugurado em 2000, utiliza placas solares para o aquecimento da água de banho e da piscina – processo que também ocorre no Sesc Pompéia. Em Pinheiros e Santana, abertos em 2004, foram instalados sistemas de reúso de água pluvial e de drenagem para utilização nas válvulas de descarga dos vasos e mictórios, para as torneiras das áreas externas e da garagem, nas torres de resfriamento do sistema de ar condicionado e também para a irrigação dos jardins.