
BRINCAR
E EDUCAR - SERÁ QUE É POSSÍVEL?
por
Maria Fernanda Loureiro de Azevedo
Ilustrações:
www.marcosgaruti.com
Há 11 anos,
quando ainda estava no processo de seleção para instrutora
de atividade do Sesc, disseram-me que eu iria trabalhar no Sesc Curumim:
um programa para crianças de 7 a 12 anos que tinha como foco a
ludicidade. Curiosa, fui à unidade de São José dos
Campos, onde li um folheto que explicava melhor o programa: "Nem
escola, nem creche, nem centro de recreação. O Curumim não
se adapta a essas definições. Apresenta-se como um espaço
de desenvolvimento global da criança. Espaço de descoberta,
invenção, criação, aventura, aprendizagem
e relacionamento. Tudo feito de forma lúdica, respeitando o que
a criança tem de mais característico: o ato de brincar".
Apesar dos meus dez anos de experiência como professora em escolas
formais, fiquei insegura e tive grandes dúvidas: será que
eu, pedagoga, vou conseguir só brincar com as crianças?
Será que brincar e educar ao mesmo tempo é realmente possível?
Como se dará a construção do saber? A sensação
de dúvida e desafio se misturou; porém, a vontade de começar
essa nova aventura superou o medo do desconhecido.
Comecei o trabalho com cuidado, pois o novo e o desconhecido sempre inspiram
cautela. Mas, esta logo se transformou em entusiasmo, em vontade de aventurar-me
e descobrir diariamente o que podia ser feito de diferente. Claro que
tudo isso foi possível por estar fora dos muros escolares e dentro
de um ambiente como o Sesc, que oferece ao profissional oportunidade de
aprender com suas experiências e na troca com outros - além
de termos liberdade de educar para a vida, para a cultura, para o mundo
e não para a prova ou nota final.
A experiência dentro desse programa ofereceu a possibilidade para
que eu retornasse à infância, reaprendendo a brincar - o
que favoreceu meu amadurecimento profissional. Fez com que eu me tornasse
uma educadora facilitadora para as crianças que estavam ali, naquele
espaço, para conviver e crescer com os outros. Ao longo desse trabalho,
percebi que, apesar de minha dúvida inicial, um programa como o
Curumim permite ao pedagogo - que, antigamente, significava o escravo
condutor de crianças à escola - libertar-se e promover o
processo de crescimento sadio da criança.
Nesse programa educativo em que o essencial é o lúdico somado
ao respeito à criança, o educador precisa ser flexível
para sair de sua área específica: vencer diariamente o desafio
de criar uma atividade lúdica, mesmo que de outra área,
ou, simplesmente, não desenvolver o que tinha programado, em função
de uma atividade que se revela de maior importância e interesse,
proposta pelas crianças.
O contexto em que ocorre o saber nessa forma de educação
não está em nenhum programa preestabelecido por adultos
especialistas. Está na roda - reunião de todas as crianças
-, embaixo da sombra de uma árvore, em uma quadra de esportes,
ou no palco de um teatro. Nesse espaço, promove-se o diálogo,
a discussão do que vai acontecer, como e por que: as crianças
têm espaço para opinar, decidir, enfim, participar ativamente.
Assim, apesar de a palavra de ordem ser o brincar, o educador não
esquece a responsabilidade de promover o ambiente educativo, de refletir
sobre sua prática, pois, como dizia Paulo Freire, "Pensar
a prática é a melhor forma de aperfeiçoá-la".
Por fim, mesmo não atuando mais como instrutora do Curumim, as
minhas dúvidas iniciais tiveram respostas positivas ao longo desse
período. Trago comigo tudo o que aprendi com essa experiência
pedagógica que, comprovadamente, valoriza o indivíduo e
favorece seu crescimento ao dar importância aos momentos de prazer
no coletivo, ao autoconhecimento, ao reconhecimento de seu papel de cidadão
e ao respeito do outro em suas diferenças.
Maira Fernanda
Loureiro de Azevedo, Pedagoga, é coordenadora do Centro de Desenvolvimento
Infantil (CEDEI), para filhos do Sesc, Senac e Fecomércio
volta
ao início
|