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História

Postado em 05/12/2006

REVISTA E Dezembro - 2006

 

 

VIDA E OBRA SEM LIMITES

 

Gertrude Stein ganhou mais destaque como mecenas e agitadora cultural do que pela produção literária, incompreendida por romper com padrões estéticos da primeira metade do século 20

 

 

Nascida em 1874 no estado da Pensilvânia, nos Estados Unidos, a escritora Gertrude Stein, filha de judeus alemães, assumiu desde cedo uma postura anticonvencional, com atitudes à frente de seu tempo. Considerada por muitos uma das pioneiras do feminismo, a autora, que morou também na Áustria e na França, cursou medicina e psicologia na Universidade Johns Hopkins, em Baltimore. Entediada com os estudos, parte com o irmão para Paris, onde se instala. Durante a estada francesa, que começou em 1903 - época em que a valorização do dólar permitia a artistas norte-americanos uma vida confortável na Europa, com regalias impensáveis na terra de Tio Sam - e durou até sua morte, em 1946, ocorreram as passagens mais célebres de sua biografia. Uma vez em meio à efervescência da Cidade Luz do início do século passado (veja boxe A cidade que era uma festa), não demorou para começar a receber em sua casa a vanguarda artística de então - pintores, escritores e outros artistas que representavam uma espécie de "comunidade de expatriados", denominada pela própria escritora como a geração perdida. "Gertrude Stein exerceu a função de tutora artística dessas pessoas", explica Luiz Paetöw, ator, criador e curador do Ciclo Gertrude Stein no Sesc Pinheiros (veja boxe No palco com Gertrude). "Ela alavancou a carreira de nomes como [o pintor catalão] Pablo Picasso, [o pintor e escultor espanhol] Juan Gris, [o escritor norte-americano] Ernest Hemingway, [o artista plástico francês] Marcel Duchamp, [o pintor francês] Henri Matisse e muitos outros que se reuniam no seu apartamento, localizado no número 27 da Rue de Fleurus". Foi esse círculo de amizades que fez com que Gertrude entrasse para a história, entre outros motivos, como a primeira a possuir trabalhos de Gris, Matisse e Picasso.



 

 

 

Rompimento de padrões estéticos
Mais comentada do que lida, Gertrude Stein ficou muito conhecida pelo "agito social" que promoveu em Paris - "social", leia-se, devido às célebres festas da Rue de Fleurus. Segundo a professora de literatura de língua inglesa e de tradução literária na Universidade Federal do Paraná (UFPR), Luci Collin, autora da tese A Composição Multidiscursiva: o Pictórico e o Cinemático nos Retratos Literários de Gertrude Stein, Gertrude tinha o hábito de entreter seus convidados (ou seria platéia?) com frases tão cortantes quanto inteligentes. "A própria escritora declarou sua intenção de ser uma figura histórica", explica a pesquisadora. "E, conquistas literárias polêmicas à parte, Gertrude passou mesmo a ser conhecida mais como figura social, colecionadora de obras de arte e mentora intelectual de jovens artistas do que como escritora." Outros estudiosos de sua vida e obra concordam com a opinião de que, embora sua figura tivesse alcançado as dimensões de estrelato da época, o mesmo não aconteceu com sua obra. Críticos de então acreditavam que ela "desfigurava" a língua inglesa, e suas frases desconcertantes - como "A rose is a rose is a rose..." [numa tradução literal, "Uma rosa é uma rosa é uma rosa..."] - chocava os editores. "Dada a opacidade de seus escritos, por muitos injustamente considerados incompreensíveis, pouca noção se tem da notável produção de Gertrude", afirma Luci. "Mas ela criou uma obra que rompe com os padrões estéticos, técnicos e de pensamento típicos do século 20."

 

 

 

 


Seus experimentos
Segundo o ator Luiz Paetöw, a produção de caráter experimental de Gertrude apontou direções inovadoras compreendidas por poucos. Paetöw conta que em uma de suas raras entrevistas, ela comentou que as pessoas costumavam pensar que o som das palavras a guiava em sua escrita, quando, na verdade, era o significado delas. "Justamente o que essas pessoas diziam que não existia em seus escritos, pois não conseguiam enxergá-lo", comenta o ator. Em virtude desse, digamos, hermetismo, foi penalizada por ser considerada inacessível para a época. "Pouca noção se tem da surpreendente variedade de gêneros e estilos que a escritora explorou em seus numerosos escritos", afirma Paetöw. "Entre peças de teatro, livretos de óperas, poemas, retratos literários, contos, novelas, romances, uma história de mistério e até uma infantil."


A autora viveu por 25 anos com sua secretária, Alice B. Toklas, que participou intensamente de sua vida. Esses momentos foram registrados pela escritora em 1933 no livro A Autobiografia de Alice B. Toklas (impresso no Brasil em 2006 pela L&PM).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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A cidade que era uma festa


No início do século 20, Paris era considerada a capital artística do mundo

 

Se hoje a capital francesa já possui lugar garantido no imaginário de muitos - "a Cidade Luz", como é conhecida pelos turistas, ou ainda "uma festa", conforme declarou o escritor norte-americano Ernest Hemingway -, o que dizer da cidade numa época em que pelos seus cafés circulavam figuras como o pintor catalão Pablo Picasso, o francês Henri Matisse e ainda o próprio Hemingway? Entre os últimos anos do século 19 e as primeiras décadas dos anos 1900, a cidade parecia mesmo atrair tudo o que era vanguarda. Tendo como cenário uma Torre Eiffel recém-inaugurada - o monumento foi concluído em 1889 -, desembarca na cidade em 1903 a escritora norte-americana Gertrude Stein; quatro anos depois, como conta Stein no livro A Autobiografia de Alice B. Toklas (publicado no Brasil pela editora L&PM neste ano), Henri Matisse completaria o quadro Bonheur de Vivre - "a primeira grande composição que lhe granjeou o nome de fauve, ou fera". Foi nessa época também que Picasso pintou o famoso retrato de Gertrude - para o qual a escritora posou 93 vezes até que a obra fosse finalizada -, trabalho que, segundo consta na autobiografia, marca o momento em que o catalão passa "da fase dos arlequins (...) para a luta intensiva que iria acabar no cubismo".




Foi nessa época, em 1910, que o bailarino russo Vaslav Nijinsky (foto), protagonista de uma trajetória brilhante e trágica - o jovem era um prodígio, mas sofria de esquizofrenia -, apresentou-se pela primeira vez na capital francesa com a companhia Les Ballets Russes, de Sergei Diaghilev. Para os que preferiam uma noite de boemia, uma boa pedida era o cabaré Moulin Rouge, inaugurado em 1889. Outra figura do período foi a livreira norte-americana Sylvia Beach, dona da famosa livraria parisiense Shakespeare and Company, responsável pela publicação, em 1922, da primeira edição de Ulysses, do escritor irlandês James Joyce.

 

 

 

 

 

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