Postado em 01/11/2005
As estradas reais, antigos acessos a centros produtores de ouro, tornam-se roteiros turísticos
HENRIQUE OSTRONOFF
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Desde 1999, vem sendo implantado o Programa Estrada Real, projeto idealizado pelo governo de Minas Gerais para o desenvolvimento econômico de municípios do estado por meio do incremento ao turismo. A partir de antigas vias conhecidas como "estradas reais", foram estabelecidos roteiros turísticos com o objetivo de levar visitantes a conhecer localidades e atrações ligadas à história dos caminhos coloniais utilizados desde o século 17 como acesso à região das descobertas de ouro e diamantes.
Ao ser definido, o projeto incluiu também localidades dos estados de São Paulo e Rio de Janeiro que faziam parte das antigas rotas. Os roteiros partem de diferentes pontos rumo a Ouro Preto (MG). De Parati (RJ), sai o Caminho Velho. Do Rio de Janeiro, o Caminho Novo. E de Diamantina (MG), o Caminho dos Diamantes. Há ainda a variante de Sabarabuçu, entre os distritos de Glaura e Cocais, ambos em território mineiro.
Apesar de ter sido denominados e concebidos a partir dos trajetos originais, os roteiros turísticos foram modificados para permitir que os visitantes possam percorrer todo o itinerário utilizando pequenas e tranqüilas estradas, muitas delas sem asfaltamento, a pé, de bicicleta, de moto ou mesmo de carro. Dessa forma, evita-se a necessidade de transitar por trechos de rodovias movimentadas construídas sobre as vias originais. Essas modificações de traçado, feitas também com o objetivo de agregar um maior número de localidades ao projeto turístico, causaram, porém, polêmica entre os pesquisadores que redescobriram e investigam as estradas reais, desde meados dos anos 1990. Afinal, argumentam, o projeto reservou aos caminhos apenas o papel de eixos estruturadores de turismo nas cidades. As estradas reais como objeto histórico, de acordo com eles, teriam sido relegadas a segundo plano (ver texto abaixo).
Um dos pioneiros nas pesquisas de resgate histórico do tema, o historiador Márcio Santos define as estradas reais como "as vias oficiais de acesso à região das reservas auríferas da capitania das Minas Gerais no século 18. A circulação de pessoas, mercadorias e ouro era obrigatoriamente feita por elas, constituindo crime de lesa-majestade a abertura de novos caminhos". A citação faz parte de seu livro Estradas Reais – Introdução ao Estudo dos Caminhos do Ouro e do Diamante no Brasil. Lá se analisa, além dos eixos que integram os roteiros turísticos, também o Caminho da Bahia, entre Salvador e Ouro Preto, que atravessa localidades do norte de Minas Gerais e do sul do território baiano junto ao vale do rio São Francisco.
As estradas reais, segundo explicam pesquisadores que se dedicam ao assunto, se tornaram vias oficiais a partir da necessidade, por parte da Coroa portuguesa, de controlar o trânsito de pessoas que entravam e saíam da região das minas gerais, desde o final do século 17, e, no século seguinte, da área do Distrito Diamantino, e assim fiscalizar o transporte de ouro e mercadorias.
Tributo e contrabando
Para cobrar o quinto sobre o ouro extraído que era exigido pela Fazenda Real, foram criadas as casas de fundição, onde o minerador deveria declarar oficialmente a quantidade do metal, pagar o tributo e legalizar sua posse. O primeiro desses órgãos foi instalado já em 1695, em Taubaté, ponto de passagem da serra da Mantiqueira, que servia de porta de entrada ao chamado Caminho Geral do Sertão, o qual, passando pelo vale do Paraíba, ligava a vila de São Paulo à região das minas.
O contrabando, no entanto, era comum, praticado com mais freqüência no Caminho da Bahia. Ao longo dessa via, principalmente nas proximidades das margens do rio São Francisco, estavam estabelecidas as fazendas onde os comerciantes compravam gado, pago com ouro, para abastecer a região das minas. Como o controle do trânsito dessa estrada se mostrava difícil, pois era formada por uma teia de trilhas, a Coroa tentou proibir, sem resultado, a circulação por ela.
Para compensar as perdas geradas pelo contrabando, facilitado pelo uso de ouro em pó como moeda de troca, em 1710 o governo português instituiu impostos sobre a circulação de mercadorias e escravos, os chamados Direitos de Entrada. Cargas de todo tipo, como alimentos e ferramentas, gado e até animais usados no transporte, obviamente quase impossíveis de esconder, eram tributados. Os registros – postos de fiscalização e cobrança de encargos – passaram a ser instalados nos três caminhos que levavam às minas, em pontos de trânsito forçoso, como locais de travessia de rios e passagens por onde era feita a transposição de serras. De início, a administração dessas barreiras de controle ficou nas mãos das câmaras das vilas, mas, em 1718, após licitação promovida pelo governo da capitania de São Paulo e Minas, elas passaram a ser geridas pela iniciativa privada, a cargo dos chamados contratadores.
O trânsito de pessoas e mercadorias se tornou cada vez mais intenso pelos caminhos. O historiador Sérgio Buarque de Holanda cita na obra História Geral da Civilização Brasileira – A Época Colonial as estimativas que se faziam da população atraída pela exploração do ouro nas primeiras décadas do século 18. Um viajante anônimo que esteve no Rio de Janeiro em 1703 fala em cerca de 80 mil pessoas ativas na mineração. Segundo Holanda, o jesuíta italiano Giovanni Antonio Andreoni, mais conhecido como Antonil, em seu livro Cultura e Opulência do Brasil por suas Drogas e Minas, publicado em 1711, menciona 30 mil, "ocupados uns em catar, outros em mandar catar nos ribeiros de ouro, outros em negociar, vendendo e comprando o que se há de mister não só para a vida mas para o regalo, em maior quantidade do que nos portos de mar". A Coroa portuguesa proibia na região atividades econômicas que pudessem causar o desvio da mão-de-obra dedicada à extração aurífera. Dessa forma, as mercadorias necessárias à sobrevivência dos arraiais surgidos em torno das lavras precisavam necessariamente ser adquiridas em outras localidades e transportadas pelas estradas reais.
Braços para o trabalho
Os caminhos mais antigos para as terras que viriam a ser conhecidas como as "minas gerais" surgiram a partir de motivação diversa à descoberta de metais preciosos. No final do século 17, a vila de São Paulo de Piratininga não passava de um pobre povoado com cerca de 3 mil moradores, praticamente isolado pela distância de milhares de quilômetros das regiões canavieiras do nordeste, que constituíam os centros econômicos de interesse para a Coroa portuguesa. Sua localização geográfica, porém, facilitava a exploração do território. O planalto oferecia passagens naturais para o interior. Uma delas, pelo vale do Paraíba, ao sopé da serra da Mantiqueira, de onde se seguia para Minas Gerais, vale do São Francisco, norte e nordeste. A configuração do relevo e a presença do rio Tietê correndo em direção ao interior permitiram também aos paulistas atingir os territórios de Goiás e Mato Grosso, onde futuramente se estabeleceriam outras áreas de mineração. No entanto, a barreira íngreme representada pela serra do Mar, que os pioneiros venciam por meio de antigas trilhas utilizadas pelos indígenas, dificultava a relação dos moradores do planalto com o litoral, levando-os a mirar o sertão.
Vivendo em uma economia de subsistência sustentada por roças e fazendas, os moradores de São Paulo foram buscar no índio braços para o trabalho, já que não dispunham de recursos para a compra de escravos africanos. Inicialmente os nativos eram capturados nas cercanias da vila de São Paulo, mas, com a escassez, passaram a ser procurados e aprisionados em locais cada vez mais distantes. Com o tempo, a mão-de-obra indígena se tornou mercadoria traficada para outras partes do Brasil, como as zonas de produção de açúcar da Bahia e de Pernambuco. Como conta a historiadora Myriam Ellis, em História Geral da Civilização Brasileira – A Época Colonial, o tráfico sofreu um grande aumento na primeira metade do século 17, com os ataques às missões jesuíticas localizadas na bacia cisplatina, "onde capturaram os bandeirantes grandes contingentes ameríndios já aculturados e aptos aos trabalhos braçais em geral".
A partir da segunda metade do século 17, a preação de índios entrou em declínio. Um dos motivos foi a diminuição da atividade açucareira no nordeste, que causou redução no uso do trabalho escravo. Com isso, a Coroa portuguesa voltou seu interesse para outras possíveis fontes de renda, entre elas a exploração de metais preciosos, cuja busca já havia sido iniciada nos primeiros tempos do Brasil Colônia. Com a nova situação, os bandeirantes foram impelidos a percorrer o território com o objetivo de encontrar riquezas. Miryam Ellis diz, no mesmo ensaio, que essas entradas foram "estimuladas por cartas régias enviadas pela Coroa portuguesa aos paulistas. Prometiam prêmios e honrarias aos sertanistas que descobrissem minerais preciosos, incentivando-os à aventura".
Muitas foram as entradas organizadas pelos paulistas, que se embrenharam pelo sertão mineiro, goiano, mato-grossense, paraguaio, alcançando até os contrafortes dos Andes e o Peru. A expedição mais famosa é a de Fernão Dias Pais em busca de esmeraldas. A viagem, repleta de reveses e atos heróicos típicos das grandes aventuras, teve início em 1674 e foi acompanhada por cerca de 700 homens, entre índios, mamelucos e brancos. Durante sete anos, a bandeira percorreu um longo itinerário até chegar à lagoa de Vapabuçu, na bacia do rio Doce, local que, no imaginário dos exploradores, guardava grandes reservas de riquezas. Ao longo do caminho, até então desconhecido do colonizador, que incluía as atuais regiões de Sabará, Serro e a serra do Espinhaço, em Minas Gerais, o bandeirante estabeleceu, para o abastecimento da tropa, roças que se tornariam arraiais, vilas e cidades.
Segundo ainda o livro de Márcio Santos, o trajeto da expedição de Fernão Dias deu origem ao que seria conhecido como Caminho Geral do Sertão. "Com a descoberta de ouro nas bacias do rio das Velhas, do rio Doce e do rio das Mortes, tornou-se esse caminho utilizado pelas levas de aventureiros que acorriam à região das minas a partir dos núcleos urbanos paulistas."
O itinerário para as minas gerais sofreria alterações com a intensificação do trânsito de pessoas e mercadorias a partir do Rio de Janeiro, porto que suplantou o de Santos na exportação de ouro. Dessa cidade, seguia-se pela baía de Sepetiba, de onde, por mar, alcançava-se Parati. Daí, novamente por terra, subia-se a serra da Bocaina até Taubaté, onde começava o Caminho Geral do Sertão. O encontro dos dois caminhos seria transferido posteriormente para Guaratinguetá por encurtar o trajeto. Para evitar o trecho marítimo, que expunha as embarcações a ataques de piratas, foi aberta uma via alternativa terrestre entre o Rio de Janeiro e o vale do Paraíba. Esse percurso todo entre as minas e o Rio, registrado desde a primeira década do século 18, seria conhecido anos depois como Caminho Velho.
Vias alternativas
O Caminho Novo ou Caminho do Garcia foi criado para resolver o principal problema da outra estrada real – o longo percurso entre o Rio de Janeiro e as minas, que demandava, de acordo com registros controversos da época, entre 30 dias e 3 meses, conforme o cronista. Além disso, a passagem pelo mar colocava em perigo constante os carregamentos de ouro. A empreitada de abertura da nova via foi oferecida à Coroa, em 1698, pelo sertanista Garcia Rodrigues Pais, filho de Fernão Dias e integrante da longa expedição comandada por seu pai à lagoa de Vapabuçu. As obras foram iniciadas no mesmo ano, a partir da propriedade que Garcia possuía no local conhecido como Borda do Campo, hoje parte do município de Antônio Carlos, em Minas Gerais. Com o trabalho de escravos e brancos, a trilha para o trânsito de pessoas ficou pronta em 1700.
Da cidade do Rio de Janeiro até o fundo da baía da Guanabara o trajeto era feito pelo mar. Desse ponto, subia a serra do Mar, atravessava os rios Paraíba do Sul e Paraibuna e seguia até os caminhos dos rios das Mortes e das Velhas que já existiam e levavam para as minas.
O Caminho Novo diminuiu o tempo de viagem entre Rio de Janeiro e Ouro Preto para cerca de dez dias. No entanto, logo depois de ter sido aberto, apresentou problemas. Não suportava o trânsito de tropas de muares, indispensáveis para o comércio com as minas, e, ao contrário do Caminho Velho, não oferecia pousos e locais de comércio para os viajantes. Além disso, o tráfego escasso propiciava a ação de ladrões. Atendendo às reclamações de uma carta régia de 1711, Rodrigo Garcia trabalhou na melhoria da estrada, tornando-a transitável para tropas de mulas, cavalos e gado, o que estimulou o surgimento de pousos e vendas para os viajantes e o desenvolvimento de povoados.
Na segunda década do século 18, foi aberto o Caminho do Proença, via alternativa que, indo do Rio de Janeiro até o rio Paraíba do Sul, tornava mais amena a subida da serra, permitindo assim também o trânsito de cavalos e mulas.
Com o passar dos anos, o Caminho Novo veio a se tornar a via de acesso mais movimentada para as áreas de mineração. O porto do Rio de Janeiro transformou-se no maior importador de produtos consumidos pela população das minas, e os comerciantes fluminenses tomaram o lugar dos paulistas como os principais fornecedores da região. Com isso, a partir de 1714 são instituídos registros na nova estrada.
Depois da segunda década do século 18, quando as notícias de descobertas de diamantes começaram a se espalhar, ganhou importância a estrada que levava de Vila Rica, hoje Ouro Preto, ao Arraial do Tijuco, atual Diamantina. No entanto, o Caminho dos Diamantes não pode ser situado no mesmo nível de importância das outras estradas reais. Em seu livro, Márcio Santos defende a idéia de que ele tinha apenas caráter local, "pois ligava dois centros dentro da mesma capitania das Minas Gerais". Embora durante o século 19 viajantes fizessem o percurso entre Diamantina e Rio de Janeiro como se se tratasse de apenas um eixo de ligação, o historiador diz que "no século 17, não obstante, havia claramente duas vias bem distintas: o Caminho Novo, de abrangência colonial, e a rota Vila Rica-Tijuco, de abrangência regional". Chamado também de Estrada Real para o Tijuco, o caminho passava pela Vila do Ribeirão do Carmo (hoje Mariana), Santa Bárbara e Vila do Príncipe, atual cidade de Serro.
As estradas reais continuaram servindo como importantes meios de comunicação mesmo após a decadência dos resultados da atividade mineradora, verificada no final do século 18. Tropeiros com suas mulas de carga percorreram intensamente essas vias durante muito tempo, pelo menos até o final dos anos 1800, transportando mercadorias e gado entre as vilas e as cidades do interior. Os naturalistas alemães Johann Baptist von Spix e Carl Friedrich Philipp von Martius e o francês Auguste de Saint-Hilaire, além do geólogo John Mawe, foram alguns dos viajantes que também utilizaram os antigos caminhos em suas expedições pelo país nas primeiras décadas do século 19.
O desenvolvimento dos meios de transporte, principalmente a partir do período imperial, exigiu transformações nos itinerários originais e adaptações nas características físicas dos caminhos. A implantação de ferrovias, iniciada no final do século 19, aproveitou os antigos traçados, como é o caso da Estrada de Ferro Dom Pedro II, entre o Rio de Janeiro e o interior de Minas Gerais. O mesmo se deu em relação a rodovias que se sobrepuseram às vias coloniais. A estrada vicinal RJ-107 para Petrópolis, por exemplo, desenvolveu-se a partir do Caminho do Proença, parte do Caminho Novo. E a velha ligação rodoviária entre São Paulo e Rio de Janeiro, anterior à BR-116 (Via Dutra), foi construída sobre trechos do Caminho Geral do Sertão.
Na rota do desenvolvimento
O Programa Estrada Real foi estabelecido em 1999 pelo governo de Minas Gerais para desenvolver economicamente, por meio do incremento ao turismo, a região correspondente à área de influência dos caminhos construídos nos séculos 17, 18 e 19 com destino à região das minas. Em 2003, foi definido como um dos 30 projetos estruturadores da agenda de compromissos do Executivo mineiro até 2006. Atualmente, a função de administrar e divulgar o programa está sob a responsabilidade do Instituto Estrada Real, entidade sem fins lucrativos criada pela Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg).
Fazem parte do programa 177 municípios, dos quais 162 mineiros, oito do Rio de Janeiro e sete de São Paulo, que se estendem pelos cerca de 1,5 mil quilômetros dos caminhos Velho, Novo e dos Diamantes. Convênios firmados com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e com as secretarias estaduais de Turismo e de Planejamento e Gestão destinaram cerca de R$ 8,5 milhões para investimentos em ações de incremento e fortalecimento das redes de turismo locais. Por meio de um projeto específico do Fundo de Fomento e Desenvolvimento Socioeconômico do Estado de Minas Gerais – o Fundese/Estrada Real –, foram garantidos recursos de R$ 12 milhões do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais para o financiamento de empreendimentos em 52 municípios.
O instituto instalou 881 marcos turísticos no trajeto dos caminhos, de um total de 1926 previstos até o final de 2006. Nessa época, deve estar pronta também a sinalização de todas as rodovias estaduais e federais que cortam ou levam às estradas reais.
A histórica Catas Altas, com 4,5 mil habitantes, situada no Caminho dos Diamantes, tem recebido cada vez mais turistas, de acordo com o secretário de turismo local, Marcos Lamego. "As pessoas descobriram o município por causa da estrada real e não pelo barroco mineiro ou pelas belezas naturais", afirma ele. O turismo crescente incentivou a construção, desde 2002, de seis novas pousadas na cidade, que passou a oferecer oito opções no total.
Outra iniciativa comercial decorrente do programa foi o licenciamento de produtos com a marca Estrada Real, a exemplo de um modelo do Fiat Doblô.
Foco desviado
Inspirado no Caminho de Santiago, que percorreu em 1994, o professor de administração pública da Escola do Legislativo de Minas Gerais Raphael Olivé procurava uma versão brasileira do famoso roteiro espanhol. Foi quando ouviu falar de estradas reais. Junto com o historiador Márcio Santos, fez as primeiras pesquisas de resgate das vias em mapas antigos e relatos de viajantes estrangeiros, como Saint-Hilaire e a dupla Spix e Martius, que estiveram no país no século 19. Ainda em 1994, Olivé e Santos passaram a identificar e percorrer os trechos originais dos caminhos coloniais mineiros.
Como assessor da Assembléia Legislativa mineira, Olivé participou da elaboração do projeto da lei, aprovada em 1999, que deu origem ao Programa Estrada Real. O objetivo era dar aos antigos caminhos o status de atração turística. Para tanto, foram previstos incentivos financeiros à conservação dos traçados originais das vias coloniais em áreas públicas e privadas.
De acordo com o professor, no entanto, a idéia inicial foi desvirtuada. "O programa não traz novidade, pois o foco está centrado no turismo em cidades e não nas estradas reais", critica. Segundo ele, o projeto deveria ser mais purista e resgatar os caminhos coloniais, mesmo que passem por vias movimentadas. "Ao percorrer a BR-040, por exemplo, o caminhante teria a dimensão histórica das transformações." Para viabilizar isso, segundo ele, bastaria adaptar a rodovia para receber os caminhantes.
Embora reconheça os benefícios econômicos gerados pelo programa às cidades integrantes do roteiro, o historiador Márcio Santos aponta o que chama de inversão da ordem dos fatos: "Em nome do interesse econômico, as pesquisas históricas foram deixadas de lado".
Santos acredita, no entanto, que, embora estudos teóricos possam reconstituir os antigos caminhos, seria difícil recuperá-los totalmente na prática, pois, "se muitos trechos se mantêm preservados, em outros os sinais que os identificariam se perderam". O historiador critica ainda o "agigantamento do projeto", uma vez que a inclusão de cerca de um quinto dos municípios mineiros dificultará o trabalho de capacitação dos agentes turísticos das localidades envolvidas. "Em geral, as pessoas dessas cidades não sabem indicar nem onde se encontram os trechos existentes das estradas reais."
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