Postado em 01/09/2004
Medo do apagão estimula sistemas próprios de geração elétrica
ALBERTO MAWAKDIYE
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Esse número - que, na opinião de alguns especialistas, está largamente subestimado - já corresponderia a quase metade do total de agentes participantes do mercado brasileiro de geração de energia, 1.018, segundo a Aneel. Entre esses, além dos APEs, devem ser computadas as companhias públicas e independentes de geração de energia, que a revendem principalmente para as distribuidoras.
Da lista da Aneel constam indústrias de todas as especialidades que se possa imaginar, e também de todos os tamanhos, embora as eletrointensivas (aquelas que consomem energia de maneira mais voraz) e as de médio e grande porte predominem. Há desde importantes cervejarias até pequenas madeireiras, de indústrias de calçados a fábricas de chocolate, de empresas do agronegócio a fundições e indústrias mecânicas.
O porte das usinas caseiras também varia muito. Há desde as de um a três geradores até aquelas que dispõem de mais de dez atuando de forma combinada. É o caso, por exemplo, da usina da indústria alimentícia Coniexpress, de Nerópolis (GO), produtora de compotas, cujo parque apresenta 13 geradores, com capacidade total de 4,5 MW. "Essa era uma exigência, devido ao tamanho da empresa", justifica Paulecir Aparecido Martinez, gerente administrativo-financeiro da companhia, que tem em seu quadro 1,5 mil trabalhadores diretos e 2 mil indiretos, e prevê faturamento de R$ 400 milhões em 2004.
Todas as empresas têm em comum a preferência pelas usinas termelétricas, sejam elas movidas a óleo diesel (caso da Coniexpress), a gás natural ou biomassa, como bagaço de cana ou casca de arroz, devido à compacidade dos equipamentos e custos de instalação e operação relativamente baixos. Já entre as grandes e tradicionais indústrias eletrointensivas, há segmentos, como o de produtores de alumínio, nos quais a geração hidrelétrica predomina ou, como na siderurgia, é muito importante.
Por conta da facilidade de implantação, até alguns hotéis e shopping centers já constam da lista de autoprodutores, principalmente nos grandes centros. O Hotel Renaissance e o Shopping Taboão, em São Paulo, o Shopping Carioca, no Rio de Janeiro, e o Shopping Piedade, em Salvador, usam co-geração a gás ou a diesel para suprir-se simultaneamente de energia elétrica e de água quente ou gelada para os sistemas de utilidades, como ar-condicionado.
A Universidade Luterana do Brasil (Ulbra), de Canoas, no Rio Grande do Sul, mantém igualmente um sistema de co-geração a gás natural em seu campus, que consumiu um investimento de US$ 6 milhões. Bastante sofisticado, o complexo fornece 5,7 MW para o campus e também alimentará de energia o hospital universitário da instituição, com 500 leitos, que deverá ser inaugurado em janeiro. "O sistema atende com sobras as nossas necessidades", diz Luiz Carlos Moreira, presidente da Fundação Ulbra.
A expansão dos APEs vem acontecendo também abaixo da linha da estatística. Do levantamento da Aneel não constam os milhares de empresas que vêm implantando minigeradores principalmente para situações de emergência, como supermercados e condomínios comerciais. Embora elas só pudessem ser consideradas autoprodutoras por causa da obrigatoriedade do registro legal de seus geradores, tais empresas acabam, mesmo que microscopicamente, participando do universo de pessoas jurídicas que decidiram, de uma maneira ou de outra, ter à disposição uma fonte própria de geração de energia.
Fim do sonho
O interesse das indústrias de implantar seus próprios parques geradores de energia não é difícil de entender. De certa forma, é a expressão da desconfiança dos brasileiros na infalibilidade do sistema elétrico do país, sentimento que se generalizou com o quase colapso energético registrado na virada do ano 2000. Até então, e por quase quatro décadas, a contar dos anos 1960, o sistema gozou da confiança mais ou menos irrestrita dos consumidores, que se mostravam até orgulhosos das enormes hidrelétricas e linhas de transmissão nas quais ele se baseava, sob a coordenação da Eletrobrás.
O sonho acabou quando um "apagão" de grandes proporções, em 2000, deixou às escuras vastas regiões do país, mostrando que os blackouts registrados aqui e ali em anos anteriores não tinham sido acidentais. Como num rosário de azares, naquele mesmo período uma seca como há décadas não se via transformou algumas represas em pouco mais do que espelhos-d’água, com impacto brutal sobre o conjunto da geração hidrelétrica. E não havia usinas térmicas em quantidade suficiente para suprir o déficit. O sistema mostrou como realmente estava, à beira do esgotamento.
O prolongado racionamento determinado pelo governo de 2001 a 2002 jogou o resto de credibilidade por terra. A restrição ao consumo foi imposta para preservar o parque elétrico - enquanto o Ministério de Minas e Energia adotava medidas emergenciais (como a construção de pequenas usinas a toque de caixa) e esboçava um novo modelo energético - e provocou um prejuízo de bilhões de dólares à economia.
"Nenhum empresário quer passar por aquilo de novo", diz Osório de Brito, diretor do Instituto Nacional de Eficiência Energética (Inee). "Por isso, muitos partiram em busca de soluções próprias para o suprimento de energia, algo de que nunca cogitaram antes."
Para Brito, essa foi uma mudança e tanto de mentalidade. Segundo ele, os agentes da economia, de maneira geral, jamais levaram suficientemente a sério os alertas de especialistas sobre um provável colapso do sistema, decorrente da ausência de investimentos em energia durante quase todos os anos 1980 e 90, por conta da crise da dívida pública que explodiu nos últimos anos da ditadura militar (1964-85) e agravou-se nos seguintes.
Hoje, mesmo com o sistema elétrico mais ou menos recolocado de pé após o choque do racionamento - principalmente porque o regime de chuvas vem colaborando e houve uma redução no consumo da ordem de 7% a 8%, devido às eficientes políticas de economia energética que pipocaram por toda parte -, há um consenso no mercado de energia de que o nível de confiança dos consumidores industriais jamais voltará a ser o mesmo e, por isso, o número de APEs deve continuar a crescer.
Na verdade, os empresários estão sendo apenas previdentes. Afinal, é sabido que o ritmo de investimentos continua não acompanhando a expansão da demanda energética, que cresce 4,5% ao ano, devendo ultrapassar a casa dos 100 mil MW em 2008 - a oferta é hoje de cerca de 88,5 mil MW.
O próprio governo admite que seriam necessários investimentos da ordem de R$ 6 bilhões a R$ 7 bilhões por ano para atender às necessidades. Para se ter uma idéia do que esse valor significa, ele corresponde, por exemplo, a cerca de metade do total destinado ao conjunto da infra-estrutura brasileira em 2003 (por volta de R$ 13 bilhões).
As profundas mudanças na configuração do setor, que se tornou mais dinâmico com a implantação do mercado livre de energia, a entrada de produtores e distribuidores independentes e o estímulo oficial às matrizes energéticas alternativas (com ênfase na geração térmica), por enquanto não trouxeram os resultados esperados.
O Brasil está há quase três anos sem licitações para hidrelétricas, e das cerca de 300 usinas de todas as modalidades prontas para ser tiradas do papel mais de dois terços estão com os projetos paralisados devido a problemas ambientais ou jurídicos. Atualmente, apenas 67 usinas estão em construção, das quais 32 são pequenas centrais hidrelétricas (PCH) e 16 compactas usinas térmicas. Contam-se nos dedos também as novas obras na área de transmissão. "Se o Brasil não conseguir atrair investimentos, a relação entre oferta e demanda novamente se deteriorará. É só uma questão de tempo", alerta o consultor paulistano Eduardo Carlos Spalding, que é também diretor de várias entidades privadas do setor de energia.
Tarifas
Diga-se que as empresas que vêm se tornando autoprodutoras de energia começam a querer mais do que apenas se ver livres do risco de racionamento, embora essa seja ainda a razão principal. Muitas que implantaram parques geradores como mera reserva estratégica e só os colocavam para funcionar, por exemplo, no horário de pico (das 18 às 21 horas), quando o preço da tarifa industrial é maior, estão hoje avançando para a substituição total da energia comprada fora pela caseira. Isso é bastante compreensível.
Devido, em parte, à política do Ministério de Minas e Energia de atrair agentes privados para participar do mercado, a partir de meados da década de 1990, o preço da energia disparou no Brasil. O estrangulamento da oferta - do qual o racionamento acabou por se tornar um símbolo - também contribuiu para a majoração.
Descontada a inflação, o preço da tarifa industrial básica cresceu, por exemplo, 23% entre 1995 e 2004. Já o da residencial aumentou cerca de 50%. A tarifa industrial brasileira é hoje a maior entre os países cujo parque é baseado em usinas hidrelétricas (no Brasil, elas participam com 91% da geração), a modalidade mais barata, embora a que exija mais investimentos para ser implantada.
O consumidor industrial brasileiro pagava, no ano passado, 16,4% a mais que o canadense e 28,7% a mais que o norueguês pela energia comprada no mercado, segundo a Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês).
Um caso típico de migração completa para a produção caseira de energia é o da Vulcabrás, fábrica de calçados de origem paulista que se mudou há alguns anos para Horizonte, no anel industrial do Ceará. A empresa usava, no início, apenas três de seus seis geradores a gás para suprir parcialmente sua demanda de eletricidade - a energia produzida pelos outros três geradores era comercializada com a distribuidora local.
Hoje, os seis geradores, que produzem um total de 5 MW, estão voltados para as necessidades da própria Vulcabrás. "Constatamos na ponta do lápis que usar a energia que produzíamos seria mais vantajoso do que vendê-la", resume René Gerodo, gerente de engenharia e manutenção da companhia.
As empresas também descobriram que eventuais projetos de ampliação podem ter custos menores, se acompanhados pelo crescimento dos sistemas elétricos caseiros. A própria Vulcabrás está cogitando adquirir mais três geradores, de modo a sustentar a planejada expansão do seu parque industrial.
É o caso ainda do complexo universitário-hospitalar gaúcho Ulbra, que prevê a instalação de mais três módulos geradores, para suprir de energia e vapor industrial um futuro centro de convenções e um hospital-dia, assim como uma nova ala do campus universitário. "A tendência das empresas, de maneira geral, é migrar inteiramente para a produção própria, quando percebem as vantagens econômicas que esta pode oferecer", explica o consultor mineiro Ronaldo Sampaio, um dos principais especialistas em energia de biomassa.
Co-geração
De acordo com Sampaio, as vantagens são ainda maiores se a energia for obtida por co-geração, a partir das linhas de produção. Com amplitude limitada, naturalmente, pelo tipo de atividade industrial (afinal, há linhas de produção que não geram calor ou frio nem necessitam deles), a co-geração sempre foi, também, prerrogativa dos grandes autoprodutores, por exigir investimentos mais expressivos e apresentar maior complexidade operacional. Mas, de fato, trata-se de alternativa compensadora.
As siderúrgicas aproveitam há tempos, por exemplo, os gases resultantes de alguns processos industriais para a criação de energia elétrica e do chamado "calor de processo", elemento essencial em várias áreas da produção do aço. Essa recuperação de energia pode reduzir em até cerca de US$ 15 o preço da tonelada de aço.
As vantagens da co-geração são também consideráveis em termos financeiros. Na capixaba Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST), por exemplo, onde o uso dos gases residuais de alto-forno e de coqueria deu à usina total autonomia energética, uma fatia de mais de 30 MW é vendida para as distribuidoras, por não ser necessária hoje para a empresa. Na fluminense Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), o emprego dos gases residuais para complementar a produção caseira das hidrelétricas Itá e Igarapava hoje permite comercializar o equivalente a 10% da energia produzida.
As usinas que não atingiram esse estágio de auto-suficiência estão lutando para alcançá-lo, de maneira ainda mais rápida do que suas irmãs menores não-eletrointensivas, e sempre de olho na co-geração. Na mineira Usiminas, onde a produção própria responde por 24% da energia utilizada, uma nova central termelétrica de 60 MW movida a gases de alto-forno deverá elevar o índice de auto-suficiência para 53%. "É uma maneira de ancorarmos energeticamente os novos projetos da companhia", afirma Rinaldo Campos Soares, presidente da Usiminas, cujos planos de expansão estão calculados em US$ 600 milhões.
No universo dos autoprodutores de menor porte, as empresas com maiores chances de recorrer à autonomia energética pelo caminho da co-geração são as que empregam a biomassa como combustível. Por serem quase todas indústrias ligadas ao agronegócio ou usinas de processamento agrícola - que compõem, por sinal, fatia considerável dos APEs chegados ao mercado depois de 2000 -, essas companhias podem fazer coincidir com facilidade os insumos de produção e energéticos, chave para a co-geração.
Praticamente todos os APEs que hoje utilizam combustível de biomassa não necessitam mais de energia externa ou estão bastante próximos disso, e aproveitam-se da co-geração. Alguns tornaram-se até grandes "comercializadores" de energia, vendendo o excedente, tal o grau de auto-suficiência. Pertencente ao Grupo Balbo, fabricante de alimentos orgânicos, a Usina São Francisco, de Sertãozinho, interior de São Paulo, consome apenas 30% dos 31 MW produzidos com a queima do bagaço de cana - os restantes 70% são vendidos para a Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL).
A energia comercializada com a CPFL já representa 5% do faturamento do Grupo Balbo, rendendo cerca de R$ 2,5 milhões ao ano. "Isso, sem contar os benefícios que advirão do ponto de vista ambiental", diz Clésio Balbo, diretor financeiro do grupo. "Como o uso intensivo do bagaço de cana como combustível é considerado fator de retirada de carbono da atmosfera, estamos aptos a receber créditos em moeda sonante por essa opção."
De fato, uma avaliação preliminar de órgãos especializados da Organização das Nações Unidas (ONU) deu conta que a Usina São Francisco tem capacidade para reduzir a emissão de 500 mil toneladas de carbono em dez anos, o que pode gerar uma receita de US$ 1,5 milhão no período com a venda de créditos de emissão para empresas poluidoras no Brasil ou no exterior, segundo os critérios estabelecidos pelo Protocolo de Kyoto.
Descentralização
Note-se que a multiplicação de APEs, embora configure uma crítica implícita aos serviços públicos e privados de geração e distribuição - e signifique uma óbvia perda de receita para os players desses mercados -, é absolutamente bem vista pelo governo. Afinal, de certa forma, a disseminação da modalidade vai ao encontro da estratégia adotada pelo Ministério de Minas e Energia de descentralizar o sistema energético brasileiro, com a multiplicação de agentes independentes, por meio da adoção em larga escala da "geração distribuída".
Prevista no novo modelo energético, a geração distribuída nada mais é do que a possibilidade, aberta pelo governo, de empresas de energia comprarem livremente eletricidade de pequenas geradoras que estejam ou venham a ser implantadas perto de seus consumidores, até o limite de 30 MW no caso de hidreletricidade e um pouco mais ou um pouco menos, dependendo do caso, quando se tratar de energia termelétrica. A idéia é que essas compras reforcem a oferta geral de energia, favorecendo a criação de uma reserva estratégica para o sistema estrutural baseado nas grandes redes de transmissão.
Pelo novo modelo, os APEs poderão passar a comercializar seus excedentes de produção (claro que até os limites estabelecidos pela lei), operação só possível hoje com autorização especial da Aneel. Não há dúvida de que o papel dos autoprodutores deverá crescer muito dentro do sistema com a liberalização do direito de comercializar energia. Não precisarão mais calcular egoisticamente sua produção, como fazem atualmente, pelo contrário: terão razões econômicas para elevar a capacidade instalada de suas centrais. Outra boa notícia é que o governo também já acena com a possibilidade de reduzir as salgadas taxas que incidem sobre os APEs.
"A multiplicação dos autoprodutores traria muitas vantagens ao conjunto do sistema elétrico brasileiro", acredita César Benjamim, economista carioca especializado em questões energéticas. "Seriam mais empresas a deixar de tirar energia da rede e mais centrais geradoras de reserva no país, a custo zero para os cofres públicos."
Nos cálculos do governo, mais APEs no mercado também significariam mais negócios na economia. De fato, vários segmentos do setor de energia começam a lucrar com o crescimento da quantidade de autoprodutores no Brasil.
As empresas especializadas em comercialização de energia, que vêm se multiplicando com a consolidação do mercado livre de energia elétrica no país, não escondem, por exemplo, o otimismo com a chegada desses novos possíveis parceiros - esse mercado está hoje ancorado nos grandes produtores e distribuidores, nos produtores independentes e nos consumidores livres. Provavelmente, caberá a elas a missão de negociar os excedentes dos APEs, já que à maioria destes deverá faltar know-how para tratar do assunto.
"Esse campo é, sem dúvida, bastante promissor para nós", afirma Paulo Toledo, diretor da Ecom Energia, empresa de comercialização de São Paulo, que, não por acaso, estendeu um de seus braços para o mercado de projetos de autoprodução. A companhia, que já fornecia consultoria na área de implantação e construção de usinas para produtores independentes, foi procurada no mês passado por uma grande indústria química paulista disposta a tornar-se APE.
A Ecom encontrará bons competidores pela frente. A mineira Cat-Leo, companhia que é um misto de construtora e operadora de energia criado pelo consórcio privado de geração Cataguazes-Leopoldina para construir e gerenciar as pequenas centrais hidrelétricas do grupo (elas são oito, até agora), abriu uma frente de negócios exclusivamente para poder dedicar-se a projetos de usinas para terceiros e de APEs.
Mas as empresas que mais vêm mostrando entusiasmo com esse mercado algo inesperado são, obviamente, as fornecedoras de equipamentos de energia. Em parte por causa da demanda dos autoprodutores, a paulista Cummins vendeu em agosto e setembro uma quantidade de geradores a gás e a diesel equivalente a 70% da registrada nos sete primeiros meses do ano. "A retomada da economia está fazendo com que muitas empresas desovem projetos de energia engavetados, inclusive nesse segmento", explica Gustavo Nielsen, gerente de geração de energia da companhia.
Já a Caterpillar, fabricante norte-americana de tratores e equipamentos de geração de energia, vem lançando com maior velocidade novos modelos de geradores para também atender a essa demanda. Isso só está sendo possível porque a empresa, atenta aos novos cenários do mercado de energia, montou, três anos atrás, uma linha específica de produção em sua fábrica de Piracicaba, interior de São Paulo, com um investimento de US$ 2,5 milhões.
As companhias que atuam no mercado de co-geração também esperam participar da festa. Aliás, já estão participando, e com desenvolta animação. Especializada em engenharia de sistemas de energia, a pernambucana Koblitz vem desenvolvendo projetos de co-geração para APEs de todos os cantos do país. Os projetos de co-geração de biomassa para as usinas pernambucanas JB Açúcar e Álcool e Petribu e de gases de alto-forno para a siderúrgica maranhense Simasa, desenvolvidos pela empresa, são tidos como alguns dos mais modernos do Brasil. "É um mercado realmente em expansão, até do ponto de vista tecnológico", afirma José Romero Rêgo, gerente comercial da companhia.
Eletrointensivas predominam
Apesar do crescimento do número de APEs no país, a participação da modalidade na produção global de energia ainda não é muito grande. Segundo os últimos dados oficiais disponíveis, contidos no "Balanço Energético Brasileiro 2003", do Ministério de Minas e Energia, o segmento dispunha de 6,8 mil MW, diante de uma capacidade instalada de 82,4 mil MW no conjunto do país. Ou seja, menos de 9% do total. Desses 6,8 mil MW, 1,4 mil MW referiam-se a energia hidrelétrica, e 5,4 mil MW, a energia térmica.
A parte do leão da energia é gerada pelas indústrias eletrointensivas, que implantaram a modalidade no Brasil ainda nos anos 1950, pelas mãos da canadense Alcan (alumínio) e das empresas do Grupo Votorantim (aço, cimento e alumínio). As eletrointensivas consomem 6% da energia elétrica produzida no Brasil e 45% da energia industrial.
As empresas eletrointensivas são também as que mais estão investindo em autoprodução nesta era de liberalização da economia e pós-racionamento. Foram R$ 8 bilhões nos últimos seis anos, com previsão de investimentos de mais R$ 9 bilhões até 2010.
"As indústrias eletrointensivas precisam de mais energia barata para ser competitivas. Por isso, têm de aumentar os investimentos na produção própria", justifica Paulo Ludmer, diretor da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia (Abrace).
Com a crescente dificuldade de implantação de novos projetos na área hidrelétrica - principalmente por razões ambientais -, a tendência é que aqueles baseados em energia térmica produzida a partir de gás, diesel ou biomassa tenham cada vez mais prevalência dentro da modalidade. Praticamente todos os APEs de menor porte a utilizam, e em alguns megassetores, como siderurgia e papel e celulose, ela também começa a predominar, via co-geração. O esperado aumento da oferta de gás natural, com a descoberta de grandes reservas no litoral de São Paulo, e a disseminação de tecnologias baseadas na queima de biomassa devem fortalecer essa tendência.
A fonte hidrelétrica para geração própria nunca foi, aliás, bem vista por alguns estudiosos do mercado de energia. "Os projetos das eletrointensivas são desenvolvidos quase sempre para ancorar aumentos do volume de produção industrial", critica Célio Bermann, professor e coordenador dos cursos de pós-graduação do Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (IEE-USP). "De uma forma ou de outra, essas empresas acabam sempre utilizando os recursos naturais para benefício próprio, fornecendo pouca contrapartida."
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