Postado em 01/09/2004
ABRAM SZAJMAN
(Presidente da Federação e Centro do Comércio do Estado de São Paulo
e dos Conselhos Regionais do Sesc e do Senac)
A capa desta edição de Problemas Brasileiros reflete uma dúvida que assombra o país há pelo menos 25 anos. Desde o final dos anos 70, os brasileiros sentem o amargo sabor de crises econômicas, causadas ora por inflação descontrolada, ora por choques de origem externa, ou ainda por crises políticas, debilidade das instituições ou falta de cuidado no gerenciamento das coisas públicas.
O Brasil foi favorecido por uma natureza exuberante, desconhece cataclismos e terremotos e tem uma extensão territorial de fazer inveja à maioria absoluta das nações. Rico em recursos naturais, com milhares de quilômetros de costa, gigantescas áreas agricultáveis e imensos espaços verdes ainda indevassados, nosso país inexplicavelmente não consegue manter uma trajetória definitiva de crescimento.
Esse mistério, novamente trazido a debate no Conselho de Economia, Sociologia e Política da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, desta vez pelo conhecido empresário Ozires Silva, revela o inconformismo da parcela mais bem informada da população, e paralelamente um profundo sentimento de frustração diante da impotência generalizada para enfrentar tamanho desafio.
Entre nós, muitos são os bloqueios que ao longo do tempo se instalaram no caminho do crescimento. Basta um exame superficial para detectar a falta de um projeto nacional, uma idéia matriz, capaz de fixar objetivos e concentrar esforços, colocando o Brasil em um rumo definido e constante. No outro lado do mundo temos o exemplo da China, um país também continental, com uma população muito maior que a nossa, que enfrentou com êxito um passado de pobreza e isolamento e agora comemora taxas impressionantes de crescimento.
Evidentemente não se podem comparar as duas economias, muito menos as realidades sociopolíticas, diversas em inúmeros aspectos. Mas merece respeito e cuidadosa observação a forma como os chineses, após fixar um projeto de longo prazo, e segui-lo à risca, alcançaram tão alto grau de crescimento. Será que o que nos falta não é exatamente um projeto nacional, amplamente discutido e, depois de aprovado, seguido com seriedade por todas as forças produtivas da sociedade?
Se nos faz falta tal projeto, sobra-nos, talvez por conseqüência, uma série infinita de vícios, a começar pela falta de estratégias e um receio doentio de assumir riscos. Decisões políticas corajosas também são raras e levam à postergação dos problemas, abrindo espaço para meias soluções ou remendos precários, marca indelével da provisoriedade.
Na ausência de objetivos claros e definidos, surge o poder paralelo da burocracia, a praga secular que atormenta a vida dos brasileiros. Levantar críticas contra o cipoal criado pelos burocratas nunca será demais, enquanto estiver presente na raiz de todos os processos, em qualquer nível da vida nacional. Parece exagerado e cansativo repetir, mas o país precisa de liberdade para produzir, um princípio que não combina com as absurdas exigências e dificuldades enfrentadas por candidatos a empreendedores. E mesmo pelos empresários já experientes, obrigados a preencher inúmeros documentos tão trabalhosos e caros quanto inúteis.
Ozires Silva citou em sua palestra o fato acontecido na Itália há alguns anos, quando foi testemunha de uma reunião de empresários e representantes da sociedade, indignados com a instabilidade, violência e corrupção em que vivia aquele país. O resultado do encontro foi a decisão de criar uma nova nação, enfrentando corajosamente os problemas que impediam os italianos, àquela altura, de alcançar desenvolvimento econômico e estabilidade política e social. Como se sabe, obtiveram êxito.
No Brasil, talvez nos falte ainda essa centelha capaz de iniciar um movimento assim, que nos livre finalmente de tantos problemas e percalços e nos coloque no caminho que, pelo menos teoricamente, todos conhecemos, mas que parece cada vez mais distante de nós.
É a reação que se espera das forças da sociedade, cansadas não só da burocracia, como de indecisões, soluções provisórias e imprevisibilidade.
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