Postado em 01/01/2005
Jogos, brincadeiras e movimento
Celina Tamashiro
Convido você, que já leu páginas de tantas atividades e reflexões, a se deixar levar por uma onda, a ir e vir, simplesmente.
Comecemos em Paris. Ao lado do Centro Pompidou, na França, está a Fonte Stravinsky, conjunto de estruturas metálicas que encanta com elementos muito simples: água, uma boca, um coração, um chapéu, uma clave de sol. O som completa a atmosfera lúdica: ruídos abruptos, zumbidos e esguichos. A obra foi criada pelos artistas plásticos Jean Tinguely (1925-1991) e Niki de Saint-Phalle (1930-2002), que conseguiram materializar as palavras do poeta e filósofo alemão Schiller (1759-1805), “...o homem só é inteiramente humano quando brinca”. Estas palavras vêm de uma profunda reflexão sobre a estética, segundo ele, a relação entre razão e sensibilidade. O importante nesta relação é que atuem juntos. Um não pode dominar o outro. A natural convergência desses dois elementos está justamente na estética, a apreciação do belo, que exige tanto de nossos sentimentos quanto de nossa razão. Brincar pode ser mais do que parece ser. Além de divertido, é algo profundo. Para as crianças, brincar é natural; para os adultos, é a forma lúdica de lidar com os próprios pensamentos e um espaço para exercer a criatividade.
Vamos agora cruzar o Oceano Atlântico e chegar ao Brasil, terra do futebol, esporte nacional. Que fascínio ele provoca em tanta gente? Costumamos dizer que há milhões de técnicos de futebol por aqui. As regras são dominadas e discutidas em todos os cantos do país, tamanha a apropriação que o brasileiro faz desse esporte. Se nossos direitos e deveres fossem da mesma forma apropriados, o exercício de nossa cidadania seria mais legítimo, mais participativo, como o jogo democrático permite.
Tudo pode acontecer num jogo, a adrenalina, a emoção da vitória ou derrota, o entusiasmo à flor da pele. O racional se transforma num elemento estratégico e a emoção explode em alegria, ou tristeza. A cumplicidade com os outros jogadores está presente nas ações, na busca de dar seguimento ao jogo e sair dele “aparentemente” um vencedor. Digo “aparentemente”, porque o importante é a participação. Jogar pode ser um grande desafio de superação e não apenas derrotar adversários.
Em qualquer ambiente, o jogo é uma expressão e facilita o desenvolvimento humano, permitindo às pessoas assimilar, transformar e exercitar sua realidade. Pode-se jogar apenas pelo prazer que ele proporciona. A competição, entendida como valor de empenho, de forma sadia, leva a uma sensação de estímulo. Uma outra vertente, a cooperação, traz uma representação diferenciada do jogo. Nela, é permitida a valorização das diferenças individuais, pois a equipe interage em torno de metas comuns, inclusivas.
Depois de navegar por várias facetas do brincar e do jogar, convido a um mergulho no movimento. Aquele que se inicia no próprio corpo, um mundo por vezes pouco explorado... O singelo gesto de oferecer a mão, abrir os braços para um abraço ou mesmo um sorriso são formas de expressão e comunicação. Movimentar o corpo amplia seu território e suas possibilidades de contato consigo e com outras pessoas. Descobrir seu movimento natural é tornar seu corpo ativo, vivo e presente em quaisquer de suas experiências.
Estas reflexões demonstram o quão amplo é o ser humano; o quanto o equilíbrio que tanto buscamos não é estático, é dinâmico. É feito de um pulsar, um ir e vir, como uma onda...