Postado em 20/07/2021
O desenvolvimento sustentável e o patrimônio cultural imaterial constituem um par de conceitos cada vez mais integrados, nos instigando a refletir sobre o nexo entre saberes, tradições e práticas culturais, mercantilização da cultura e as múltiplas dimensões da sustentabilidade.
À crescente busca por harmonizar nossa relação com bens naturais e territórios com a dimensão imaterial do patrimônio, somam-se condicionantes econômicas em um contexto desafiador de crise mundial.
Muitas mudanças têm ocorrido nos últimos anos, assinalando tendências que combinam a polissemia da sustentabilidade com as complexas
relações entre cultura e economia. Essa interdependência tem se intensificado, destacando a importância dos elementos culturais intangíveis na
formação de um modelo desenvolvimentista sustentável. Os exemplos de entrelaçamentos entre práticas, saberes, representações e sustentabilidade se multiplicam.
A premissa que constitui o ponto de partida do tema desta edição é a convicção de que patrimônio cultural imaterial e desenvolvimento sustentável estão imbricados e merecem análises que assim os considerem.
Organizado pela pesquisadora de pós-doutorado Simone Toji, em colaboração com o Centro de Pesquisa e Formação do Sesc São Paulo, o presente dossiê
reúne artigos que debatem a relevância da construção de ações mais consistentes e integrativas, trazendo experiências de diversas localidades que buscam retratar a complexidade e multiplicidade do tema.
O artigo “Difícil travessia: a consolidação das políticas de patrimônio cultural no século XXI”, escrito pela museóloga Celia Maria Corsino, abre
o dossiê com um breve histórico do processo de institucionalização da política de patrimônio imaterial no Brasil, apresentando os desafios da gestão pública na consolidação do campo junto ao patrimônio cultural material.
Em “Sustentabilidade cultural na política federal de salvaguarda”, a cientista social Rívia Ryker Bandeira de Alencar reflete sobre o conceito de sustentabilidade cultural considerando as condições nas quais os bens culturais são produzidos.
Doutor em Arquitetura e Urbanismo pela FAU-USP, Marcelo Cardoso de Paiva discorre sobre os efeitos econômicos das políticas do Ministério da Cultura em “Patrimônio, democracia e desenvolvimento: as políticas de preservação de Iphan após a criação do MinC”.
Chiara Bortolotto, antropóloga especializada em políticas de patrimônio e governança global, examina as controvérsias da comercialização do patrimônio, em seu texto intitulado “Comercialização ‘boa’ e ‘má’: dilemas normativos entre as racionalidades do patrimônio”.
Adriana de Souza de Lima e Dauro Marcos do Prado, lideranças
caiçaras da Jureia, abordam a relação entre o patrimônio cultural e o viver caiçara, cotejando-os com a política ambientalista no texto “O viver caiçara: um patrimônio cultural ameaçado pela política ambiental na Jureia (SP)”.
O agricultor familiar Laudessandro Marinho da Silva e a bióloga e socioambientalista Raquel Pasinato escrevem em coautoria o artigo “Patrimônio cultural imaterial, conservação e desenvolvimento sustentável em territórios quilombolas do Vale do Ribeira–SP”, no qual trazem suas perspectivas sobre o caso dos quilombos do Vale do Ribeira e como o sistema agrícola praticado pelos quilombolas se tornou um patrimônio cultural brasileiro.
A questão da sustentabilidade no contexto da preservação e mercantilização do patrimônio cultural imaterial na China contemporânea é abordada pelo professor e pesquisador no Instituto de Pesquisa em Antropologia da Universidade de Zhejiang Philipp Demgenski.
O pesquisador e professor Panas Karampampas arremata o dossiê com uma análise da conexão entre a crise econômica grega e o reforço na
mercantilização do patrimônio cultural imaterial do país no artigo intitulado “Sustentabilidade e planos de salvaguarda do patrimônio cultural imaterial na Grécia”.
A edição prossegue com quatro artigos acerca de temas variados. A cultura japonesa em São Paulo é analisada pelo pesquisador Victor Hugo
Kebbe, enquanto o historiador Rubens Panegassi contribui com uma análise dos sistemas alimentares e a colonização ibérica das Américas.
O percurso da cultura livre da internet é o tema do artigo de Leonardo Foletto, jornalista, escritor e pesquisador. Também jornalista e pesquisa- dor, Rodrigo Pereira explora o cinema brasileiro inspirado em filmes hollywoodianos por meio da análise da produção do ator e diretor C. Adolpho Chadler.
Três artigos elaborados por egressos do Curso Sesc de Gestão Cultural são apresentados ao público leitor nesta edição: Juliana Costa Bitelli e Yasmin Abdalla Silva dos Santos exploram eventos culturais e a preservação do patrimônio; Juliana Santos analisa a formação de leitores nas bibliotecas do Sesc São Paulo; Albervan Reginaldo Sena, Elaine Pereira Aguiar, Igor Augustho Mattos Kijak e Tamara Batista Borges discorrem sobre as Artes Cênicas no Brasil nos últimos anos.
A diretora executiva da cadeira da Unesco em Patrimônio Imaterial e
Diversidade Cultural, Cristina Amescua Chávez, é a entrevistada desta edição, tratando de questões como patrimônio cultural imaterial no contexto latino-americano e as lutas das minorias por autenticidade e salvaguarda cultural.
O compositor Sergio Molina resenha o livro “Uma árvore da música brasileira”, organizado por Elisa Mori e Guga Stroeter e publicado pelas Edições Sesc. A edição traz ainda uma contribuição da tradutora e poeta Francesca Cricelli e um ensaio fotográfico de Nego Júnior com registros de eventos de samba-rock em São Paulo.
Com esta publicação, o Sesc espera contribuir para desvelar novas formas de apreender, interpretar e construir caminhos que articulem diferentes conhecimentos e práticas culturais em constante diálogo com as necessidades do desenvolvimento sustentável.
Boa leitura!
Danilo Santos de Miranda
Diretor do Sesc São Paulo