Postado em 18/11/2020
Pra quem dizia não ter tempo para nada, agora tem tempo de sobra. Um tempo vazio, perdido e cheio de questionamentos sobre o que poderá piorar para que tudo melhore antes que seja tarde demais. Vimos que a cor da pele ainda incomoda muita gente, ao ponto de pintar o asfalto de sangue e tirar vidas que importam, ou pelo menos deveriam importar. Chegamos a Marte, mas não conseguimos chegar diante do respeito que almas calejadas pela guerra, fome, desigualdade e preconceito mereciam estar. A religião tem perdido sua função e se transformado em um grande circo de aberração. Se tornou um jogo impetuoso de quem tem a divindade mais poderosa, a fé mais inabalável e o sofrimento mais promissor que garantirá um camarote no céu. Falando em céu, ele se tornou vermelho com o fogo que devastou e tem devastado florestas, fazendo a vida desaparecer, lamentar, implorar que tudo pare, antes que vire apenas cinzas e esquecimento. Questionamos a vida mais do que todos os outros anos, porque agora ela corre perigo. Perigo de ser esquecida, perigo de ser rara, perigo de entender que não importa quanto dinheiro, poder e status temos, um único vírus tem a chave para acabar com tudo. E o que é tudo agora? Se nos sobrou apenas a saudade imensurável de estar perto de quem se ama, de apertar uma mão amiga, dar um abraço ou apenas viver a vida que vivíamos roboticamente como se fosse descartável demais para darmos a atenção que ela realmente merece. Merecimento, talvez seja isso que 2020 queira nos mostrar, somos merecedores das nossas próprias escolhas, então chegou a hora de escolher melhor, antes que não haja nenhuma alternativa.
Ei, menina linda, parada no canto da quadra, isolada, com sua lágrima imaculada, chorando por algo que não é culpa sua, e nem pode ser assim classificada. Eles falaram que o seu cabelo é ruim, sua pele escura demais, seu nariz largo e seus traços desajeitados. Deram apelidos pesados, te fazendo se sentir a pior pessoa, mas isso não é uma escolha. Você fica chorando, talvez querendo desaparecer, mas vou te dizer que almas como a sua devem sempre florescer. Mas deixe te dizer, preste muita atenção, a pele que eles tanto caçoam tem o poder de mudar uma geração. Eles não foram os primeiros e muito menos serão os últimos, que acham engraçado te colocar em um submundo. Essa pele tem história, histórias das quais eles nunca saberão, histórias de dor, sofrimento, luta e desigualdade que livros nunca descreverão. Mas eu não estou aqui para lembrar de sofrimento, então enxugue essas lágrimas, porque nelas não há acalento. Não prenda o seu cabelo, se chamam ele de rebelde é porque ele lutou para estar solto e aparecendo. Olhe seus traços, são fortes e mostram garra, de que não precisa se apoiar em ninguém para vencer uma batalha. Você carrega amor, força e essência de que nunca recua e seus medos sempre enfrenta. A pele negra é linda, essencial e inesquecível, talvez seja por isso que ela nunca passará despercebida. Você tem uma missão, então não solte a minha mão. Quer que lembrem de você triste e arrependida pela falsa decepção? Ou que escrevam em livros as suas conquistas e em jornais as suas premissas? Essa pele carrega uma história, que está apenas começando a ser escrita. Não deixe que os outros mostrem que a cor te limita. Sorria e mostre a força daqueles que morreram lutando, para que você estivesse alegre e não chorando. Mostre que a pele negra só é diferente para quem não entende, que toda grande árvore começa por uma única e pequena semente.
- Quero que você nunca cresça! - Parece egoísmo eu sei, mas eu juro que é porque te amo demais e quero inutilmente adiar os testes que a vida lhe dará, mesmo sabendo que isso só te tornará ainda mais forte. O mundo adulto não é tão mágico como contam os contos de fadas. Existem pessoas ruins que tentarão fazer você acreditar que seus sonhos serão apenas sonhos e que seu coração é tão descartável quanto um papel de bala. Você vai chorar muitas vezes, mas vai ter que respirar fundo e seguir em frente, sempre seguir. Pessoas que você ama morrerão, mas será tarde demais para você acreditar que elas apenas “vivaram estrelinhas”, porque a saudade de quem nunca mais vai voltar dói igual ralar o joelho andando de bicicleta. Vão falar que o seu corpo está fora do padrão, que você precisa ser igual a outras pessoas em uma tentativa quase em vão. As escolhas serão a pior parte, porque, afinal, a vida é feita de escolhas e quando se escolhe uma coisa se perde outra. Dessa vez você não poderá levar o picolé de morango e limão. Às vezes, a tristeza vai bater na sua porta e você terá que atender, só me faça um favor, não convide ela a entrar, existem visitas que são necessárias, mas que não se deve acomodar. Diz a velha história que dinheiro não compra felicidade, e realmente não, mas não romantize a pobreza, você merece sempre o melhor e nada menos que isso. Cuide de seus sentimentos, não é qualquer um que merece sua atenção. Seu corpo, suas regras, saiba dizer sim, mas, principalmente, não. Ame quem ama viver, a vida é um presente único, aproveite cada segundo e não se prenda esperando as sextas-feiras ou alguma realização. Não deixe limitarem sua fé, Deus é grande e não cabe em uma colher. Não quero que você cresça porque a sua dor sempre vai me doer, mas cicatrizes são bem mais bonitas quando se tem histórias para oferecer. Enquanto isso não chegar, prefiro te ver vestida de super-heroína, aproveite enquanto sua única preocupação é se está pronta a gelatina.
Marcos Paulo Telles nasceu em Birigui, interior de São Paulo, em 15 de Julho de 1989. Graduou-se em Comunicação Social. Autor de quatro obras publicadas e um conto. Iniciou sua carreira literária em 2015 quando propôs escrever diversas obras dos mais variados gêneros literários, mostrando que não importa como a escrita é empregada, histórias envolventes sempre conseguem transportar o leitor para universos inesquecíveis.
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