Postado em 19/11/2019
Muito além disso, a moda de origens africanas naturalmente inserida dentro da cultura brasileira oferece diferentes possibilidades e traz à tona, em meio a muitas cores e estampas geométricas, também algumas discussões acerca do respeito e apropriação cultural, empoderamento racial entre outras.
Como lembra a estilista e educadora, Cynthia Mariah, coordenadora de estudos e pesquisas da Anamab (Associação Nacional de Moda Afro-brasileira) e do Núcleo de Pesquisa de Moda Africana e Afro-diaspórica, fazer moda não é só fazer roupa, principalmente no mundo contemporâneo, cheio de anseios existenciais e questionamentos. Assim, a moda afro-brasileira vem carregada de conceitos de criação e manutenção de identidade e de pontos de discussão sobre o resgate da cultura, entre outras questões.
Graduada em Design de Moda pela Faculdade de Tecnologia Carlos Drummond de Andrade, e mestranda em Têxtil e Moda na EACH- USP, Cynthia integrou a programação de outubro do Sesc Birigui, dentro do projeto Tecnologias e Artes em Rede: Tecnologias Negras, com a oficina “Moda afro-brasileira: introdução ao processo criativo”.
Como destaca a estilista, a moda afro-brasileira tem como principais características elementos que remetem à ancestralidade, representatividade cultural e estética afro-brasileira, padronagens étnicas e o uso de cores na sua maioria quentes e vibrantes.
“A moda sempre utilizou de elementos afro, principalmente se pensarmos em África, porém só nos últimos anos vem assumindo esses elementos como fonte de inspiração. Fugindo das versões ‘safári’, temos alguns modelos de acessórios, estampas e padronagens geométricas, modelagens que lembram ou simulem amarrações”, complementa e exemplifica.
Apesar de muitas vezes diluída em determinadas culturas e mercados, a moda acaba compondo um processo importante de empoderamento racial, já que, por meio dela, é possível transmitir identidade, expressar características que remetem a personalidade e classificação de pertencimento de grupos, como afirma ainda Cynthia.
Questionada sobre a apropriação cultural dentro da moda, a estilista acredita ser uma questão de ética. “Nada impede de tomar um elemento como inspiração, porém, a representação real de qualquer elemento cultural exige respeito com às tradições e povos que fazem seu uso; é necessária uma conexão de ideias e pesquisas para que, além do estético, se passe uma mensagem”, ressalta.
Pessoas brancas podem fazer uso de um elemento étnico sim, desde que tenham uma afinidade com os elementos culturais e um entendimento básico sobre o uso nativo. Já a criação envolve as ligações que essa pessoa tem com a cultura, de forma que suas bagagens de vivência se entrelacem com o seu processo de criação. Então, não vale criar só porque está na moda ou pensando no rentável”.
A terceira edição do Tecnologias e Arte em Redes teve como tema as Tecnologias Negras, com cursos, encontros, palestras, bate-papos e oficinas que destacaram o protagonismo de pessoas negras nos campos das artes visuais e das tecnologias. As atividades foram pautadas pelos caminhos para reverter os impactos causados pelas estruturas raciais discriminatórias no desenvolvimento e difusão de tecnologias digitais e analógicas. O objetivo das ações foi articular e dar vazão à produção de grupos que tiveram suas narrativas suprimidas historicamente, a partir de um espaço democrático de discussão.