Postado em 19/07/2019
No cenário, apenas uma mesa branca e sobre ela um copo virado pra baixo. É ali que os quatro atores contam histórias de terror e dividem suas próprias experiências com drogas lícitas e ilícitas.
Este é o enredo de A Noite dos Mortos-Vivos, estreia com direção de Paula Picarelli no Espaço Beta do Sesc Consolação. Para entender um pouco mais sobre a montagem do espetáculo, que teve a colaboração do sociólogo e professor Ronaldo de Morais, também um dos atores em cena, a EOnline conversou com o elenco no Teatro Vertigem, onde ensaiavam.
A ideia surgiu de uma conversa entre Paula e Ronaldo, quando se conheceram fazendo o espetáculo Amadores, há mais ou menos três anos. "Eu tinha um informação muito forte que na primeira tragada de crack sua vida acabou. [...] E o Ronaldo pra mim ali na minha frente era a prova concreta de que isso não é verdade", comenta Paula. A princípio o espetáculo seria um monólogo com o depoimento de Ronaldo, mas ambos concordaram que era impossível falar de drogas sem falar de racismo e de outras experiências diferentes sobre o mesmo assunto. Paula complementa que "... quando a gente começou a conversar sobre o uso de drogas - esse é o foco dessa peça - a gente começou a perceber que o assunto é mais complexo e que é impossível você falar sobr eo uso de drogas sem falar sobre racismo". Foi aí que entraram no projeto Flavio Falcone e Nilcéia Vicente.
Flavio é psiquiatra e palhaço e tem um trabalho na Cracolândia de São Paulo. "Eu tenho uma experiência de trabalhar desde que eu me formei com moradores de rua, uma experiência de trabalhar 7 anos dentro da Cracolândia, diretamente em contato com os usuários, e eu sei que a Cracolândia é a vitrine da política de drogas. E eu tenho muita informação. Então pra mim é um dever eu compartilhar a informação que eu tenho. E a forma como eu escolhi de fazer isso é através da arte". Flavio desmitifica o uso de drogas pela sua carreira na psiquiatria trabalhando com os diversos usuários de drogas.
Nilcéia, atriz, traz suas experiências com conhecidos no tráfico, principalmente em abordagem de inocentes, vítimas, só por serem negros. "na minha trajetória mesmo nunca tendo me envolvido diretamente de forma mais vertical com esse universo das drogas [...] mesmo assim eu tive um contato muito grande com pessoas que acabaram morrendo por conta de estarem ligadas de alguma forma com o universo do tráfico, ou pessoas que foram abordadas por serem suspeitas quando não tinham absolutamente nenhuma culpa no cartório, simplesmente pelo fato de serem pessoas negras". A atriz discute o problema das drogas como sociedade e incita essa reflexão no público.
É, então, nesse contexto que a entrevista revela a intenção do espetáculo para com o público: reflexão sobre a política e o uso das drogas, como indivíduos e, principalmente, como sociedade.
O espetáculo está em cartaz de 22 de julho a 27 de agosto, às segundas e terças, às 20h, no Sesc Consolação. Para mais informações e ingressos, clique aqui.