Postado em 11/06/2019
Por Caco de Paula*
Em algumas dezenas de pontos de venda na região metropolitana de São Paulo e nas estradas para o litoral é possível ver um freezer expositor de sorvetes com a marca Empório Mata Atlântica. Imagens aquareladas de folhas de espécies nativas decoram o equipamento por fora. Por dentro, está recheado de frutas de verdade, a começar por cambuci, uvaia e araçá, congelados e também em forma de polpa, picolé, sorvete e suco. Por trás de tudo isso há um propósito de conservação ambiental e de economia solidária. Um engenhoso arranjo faz com que o picolé consumido aqui financie o crescimento da floresta acolá. A iniciativa do Instituto Auá, com sede em Osasco, tem impactos em campos e periferias de dezenas de cidades paulistas. Não, essas frutas não são extraídas de matas protegidas, mas plantadas em áreas agrícolas. Com 22 anos de existência, o Auá é fruto de aprendizados coletivos que unem educação de jovens e adultos a práticas agroflorestais e empreendedorismo socioambiental. E prova que há outros modos, modos sustentáveis, de conviver com um bioma que teve quase 80% de sua área original reduzida a ferro e fogo.
Vocação pessoal e territorial
“Assim como cada ser humano tem etapas na construção de sua capacitação e de sua ação realizadora, as instituições passam por um processo gradativo até a realização de seus potenciais institucionais”, ensina a professora Ondalva Serrano, fundadora e conselheira da organização. “Tudo é processo”, diz. Em alguns pontos a história do Auá confunde-se com a sua própria. Agrônoma formada pela ESALQ- USP, Ondalva ensinou administração de empresas rurais por 10 anos. Crítica do modelo de agronegócio que, desprezando a diversidade de biomas, impõe práticas padronizadas, Ondalva tornou-se referência não apenas em agroecologia mas também em educação integral. Desde a década de 1980, articula essas disciplinas em experiências que a levaram a participar da criação da Reserva da Biosfera do Cinturão Verde da Cidade de São Paulo, nos anos 1990, entre outros projetos com FAO e Unesco. “Foi através de abordagens transdisciplinares, comprometidas com os biomas locais, que pudemos desenvolver a potencialidade dos jovens e o vocacional dos territórios”. As negociações com indústrias de alimentos e bebidas, além de um número crescente de prefeituras que servem suco de cambuci na merenda escolar.
Melissa, Gabriel e Ondalva, no armazém do Instituto Auá
Simultaneamente à abertura de mercado, há uma atuação lá na roça. A educadora Melissa Branco, que participa do instituto há dois anos, trabalha no relacionamento com famílias de produtores na região de Sorocaba. Organiza cursos, vivências e mutirões. E recentemente ajudou em um processo de certificação. Sonha com um dia em que os agricultores sejam mais valorizados, que mais pessoas tenham acesso aos orgânicos e mais consciência sobre sua nutrição. “Mesmo sendo urbanos, pertencemos à floresta. Nós nos nutrimos do ar, da água e do alimento que ela nos dá”, lembra. “E não se trata apenas do aspecto físico do alimento, mas da consciência sobre todas as relações, sutis, energéticas, sociais e de afeto que estão envolvidas na sua produção”.
Rota do cambuci
A formação de jovens para o ecomercado está na proposta da instituição desde seu início, em 1997. Mas o momento para abrir esse ecomercado só chegaria em 2013. “Conhecemos o conceito do empreendedorismo social do Muhammad Yunus e decidimos que era exatamente isso o que queríamos”, diz Gabriel Menezes, no time há 15 anos, e atual presidente do Auá. A entidade passou por uma remodelação e criou 14 empreendimentos. Um deles é o Empório Mata Atlântica. A marca que leva os picolés a 80 pontos de venda conversa com a Rota do Cambuci, movimento espontâneo de valorização do fruto nativo que reúne 15 municípios numa ação coordenada pelo instituto. Em 2018 o instituto comprou 60 toneladas de cambuci. Ainda em fase de crescimento, o ecomercado não consumiu toda a safra, em boa parte ainda estocada a 22 graus negativos nas câmaras frias do Auá. Neste ano espera-se que 100 produtores colham cerca de 90 toneladas. Assim, a prioridade de Gabriel são as negociações com indústrias de alimentos e bebidas, além de um número crescente de prefeituras que servem suco de cambuci na merenda escolar. Simultaneamente à abertura de mercado, há uma atuação lá na roça. A educadora Melissa Branco, que participa do instituto há dois anos, trabalha no relacionamento com famílias de produtores na região de Sorocaba. Organiza cursos, vivências e mutirões. E recentemente ajudou em um processo de certificação. Sonha com um dia em que os agricultores sejam mais valorizados, que mais pessoas tenham acesso aos orgânicos e mais consciência sobre sua nutrição. “Mesmo sendo urbanos, pertencemos à floresta. Nós nos nutrimos do ar, da água e do alimento que ela nos dá”, lembra. “E não se trata apenas do aspecto físico do alimento, mas da consciência sobre todas as relações, sutis, energéticas, sociais e de afeto que estão envolvidas na sua produção”.
Freezer expositor: bandeira em defesa da agrofloresta fincada em 80 pontos de venda da região metropolitana de São Paulo
*Caco de Paula é jornalista e dedica-se à pesquisas e edições multimídia sobre educação, cultura, ambiente e sustentabilidade. Escreveu para algumas das principais publicações do país nos últimos 40 anos e dirigiu a revista National Geographic Brasil. Co-autor dos quadrinhos “Heróis do Clima”,criou a agência Auá Brasil e colabora com projetos e edições do Sesc SP.
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