Postado em 21/01/2019
Antônio Abujamra costumava encerrar as entrevistas de seu programa Provocações, na TV Cultura, com a mesma pergunta: "O que é a vida?"
Para rememorá-lo, fomos até o escritório do jornalista Leonardo Sakamoto e à casa da atriz Renata Carvalho e resgatamos a tradicional questão, ao mesmo tempo tão simples e tão cheia de possibilidades.
Para nossa surpresa, os dois citaram o mesmo escritor em suas respostas. Você adivinharia quem é?
Leonardo e Renata participam dos Encontros Provocadores, uma série de bate-papos que fazem parte da programação paralela à exposição Rigor e Caos, dedicada à obra do diretor, ator e apresentador Antônio Abujamra, no Sesc Ipiranga.
De universos bem diferentes, os dois têm em comum - além de Guimarães Rosa - a fama de provocadores. Como não poderia deixar de ser, tivemos conversas instigantes com cada um deles. Leia a seguir.
Renata Carvalho, atriz, trans, 37 anos.* Você é provocadora? A provocação é inerente ao meu corpo. Meu corpo é provocante, provoca o desconforto, a sexualização, o fetiche. Sou uma pessoa que incomoda, que provoca, meu corpo é político mesmo. Que provocação você gostaria de fazer? A grande provocação que nós, artistas transgêneros, deixamos para a arte, para os artistas cisgêneros, é que queremos fazer um grande acordo nacional. A gente pede que os artistas cisgêneros parem de interpretar personagens trans, incluam artistas trans em seus coletivos, suas instituições. Que as instituições parem de contratar espetáculos que tem trans fake, ou seja, atores cis interpretando trans, da mesma forma que a gente já não compactua com o blackface.
O que a representatividade tem a ver com a violência contra as pessoas trans? A gente quer estar nesses espaços de poder para que os olhos cisgêneros se acostumem, se acalmem, se naturalizem com corpos como o meu, para não sermos mais corpos provocativos, para sermos corpos naturais como qualquer outro corpo.
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Leonardo Sakamoto, jornalista, cis, 41 anos.* Você é provocador? Durante muito tempo eu não me considerava tão provocador. Só que os próprios leitores me apontavam isso, os colegas, o analista, todo mundo ia me mostrando: sim, você é uma pessoa provocadora. [...] Sou repórter, cobri guerras, sou cientista político, pesquisador. Você vai somando todas essas coisas para provocar - com a experiência, com jornalismo, com a análise - o pensar de outras pessoas. Eu gosto muito de fazer com que as pessoas reflitam e pensem sobre suas posições consolidadas. Na situação ultrapolarizada que nós temos hoje, em que as pessoas não escutam umas às outras, se você conseguir provocar as pessoas a refletirem sobre suas posições de forma educada, de forma empática, de forma simpática, acho que você acaba cumprindo um papel importante. Que provocação você gostaria de fazer? Primeiro, queria repetir a provocação que o Abu fez comigo quando estive no programa [Provocações], que achei sensacional. Ele me perguntou: "Sakamoto, qual foi a pior invenção da humanidade: os bancos, a desigualdade ou a religião?". Eu respondi que é a religião. Outra provocação boa é se perguntar: Você tem feito de tudo para que no final da sua vida você não se arrependa? Eu tento me provocar e pensar sobre isso o dia inteiro.
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