Postado em 09/01/2019
O que está fora de nosso campo de visão ainda continua existindo. É com esse mote deflagrador e a percepção consciente do espaço social e de suas contingências políticas que a exposição Campos de Invisibilidade, em cartaz no Sesc Belenzinho até 3/2/2019, foi concebida e articulada.
Trata-se de uma exposição coletiva dedicada a investigar e refletir sobre a ecologia dos problemas mobilizados por uma infraestrutura tecnológica global que toma conta do mundo de forma escamoteada e integra o cotidiano das pessoas. As iniciativas que corroboram para esse debate foram reunidas nesta mostra de concepção e curadoria do artista e pesquisador Cláudio Bueno e da curadora e pesquisadora Ligia Nobre, que contam com a assistência de curadoria do jovem pesquisador e artista Ruy Cézar Campos.
A realização de Campos de Invisibilidade contou com a atuação de "O Grupo Inteiro", coletivo de artistas e pesquisadores formado pelos dois curadores da mostra, a arquiteta e professora Carol Tonetti, responsável pelo projeto expográfico, e o artista e designer Vitor Cesar, dedicado ao projeto gráfico da exposição. De forma ampla, esse grupo dedica-se à produção de arte e conhecimento em diversos campos — arte, design, aprendizagem, arquitetura e tecnologia —, limando fronteiras e pondo suas reflexões e práticas no âmbito da esfera pública.
A exposição e a sua programação pública integrada escancaram os modos de atuação dessa gigantesca infraestrutura tentacular que se faz invisível. Na percepção dos curadores, esses modos permeiam várias ordens da vida: técnica, social, ambiental, sexual, espiritual, econômica, estética e, enfim, política. Tais aspectos acabam por atualizar e dar sequência global a normas e narrativas coloniais pré-existentes que permeiam a história da humanidade.
Partindo dessa premissa geral, um tanto assustadora, mas real, a exposição procura questionar certos consensos que estão na ordem do cotidiano, como, por exemplo, a ideia abstrata de nuvem, que congraça suposta acessibilidade universal, segurança e qualidade de vida, via aparelhos digitais e a rede de internet.
Artistas do Brasil e de mais seis outros países, com várias origens, formações e experiências de criação, formam o elenco dos dezoito profissionais participantes da mostra: Ada Lovelace, Alan Turing, Aretha Sadick, Bruno Mendonça, Carolina Caycedo, Cristine Takuá, Déborah Danowski, Denise Agassi, Emma Charles, Felix Pimenta, Jon Rafman, Julio Plaza, Kabila Aruanda, Louis Henderson, Rita Wu, Ruy Cézar Campos, Tabita Rezaire e a organização coletiva Territorial Agency.
Os 23 trabalhos apresentados na mostra são ações, construções e narrativas que podem ser fotográficas, audiovisuais, gráficas e textuais, todas incorporadas em cinco núcleos conceituais e poéticos definidos pela curadoria: Nova Praia do Futuro; Adeus a Sete Quedas; Ouroboros; Cosmogramas; Visualizações do Mundo.
Parte dessas produções é constituída a partir de contextos bem específicos que, entretanto, ganham ressonância global, como: La Guajira (Colômbia), Agbogbloshie (Gana), Praia do Futuro (Ceará), Mariana (Minas Gerais), Aldeia Rio Silveira (São Paulo) e Pico do Jaraguá (São Paulo). Em uma outra gama delas, apresentam-se práticas de indivíduos que enfatizam as arquiteturas dos seus próprios corpos como locus central de ação, ou ainda, a coexistência e o convívio com outros seres, não apenas humanos.
A produção artística apresentada e os debates ensejados pela proposta de Campos de Invisibilidade buscam investigar os modos de percepção, controle e circulação de informações contidas nos entendimentos consensuais quanto à suposta imaterialidade dessas infraestruturas tecnológicas e de seus dispositivos. Desta forma, há uma vontade intrínseca às iniciativas artísticas em demonstrar formas de tomada de consciência e contenção de uma era de catástrofes. Trata-se, portanto, da urgência em demonstrar de forma cadente a concretude do aparato tecnológico onipresente, uma espécie de contracampo daquilo que vemos, relacionando-os aos corpos, à natureza em amplitude e aos mais diversos territórios.
Conversamos com o curador Cláudio Bueno, que falou um pouco sobre os principais temas abordados na exposição.