Postado em 29/11/2018
A obra de Tarsila do Amaral inovou a linguagem
das artes plásticas com elementos da vanguarda europeia
associados à cultura popular e à antropofagia
Engajada nos movimentos Pau-Brasil e Antropofágico, encabeçados por Oswald de Andrade nos anos 1920, Tarsila do Amaral (1886-1973) tornou-se símbolo do modernismo brasileiro. A pintora alimentou-se das vanguardas europeias do início do século e deglutiu essas inovações no caldeirão cultural de um país marcado pela miscigenação para transfigurá-las em arte nacional.
Embora não estivesse no Brasil durante a Semana de Arte Moderna, ocorrida em fevereiro de 1922, chegou pouco tempo depois, no mês de junho, após uma temporada de dois anos na Europa, e, por obra de Anita Malfatti, logo se aproximou dos modernistas paulistas Menotti del Picchia, Mario de Andrade e Oswald de Andrade. Os interesses comuns os uniram no chamado Grupo dos 5.
O relacionamento com Oswald pavimentou a parceria na vida e na arte. A pintora e o escritor se apaixonaram e viajaram juntos pela Europa durante o ano de 1923. A união, oficializada em 1926, foi tema do poema Tarsiwaldo, escrito por Mario de Andrade em homenagem à dupla.
Nessa imersão, a prática de vanguarda foi desenvolvida, sobretudo, “com os seus amigos artistas que viviam em Paris – o poeta modernista Blaise Cendrars, o escritor/cineasta Jean Cocteau e o pintor Fernand Léger”, cita a autora do livro Tarsila do Amaral: A Modernista (Edições Sesc São Paulo), Nádia Battella Gotlib. A obra A Negra (1923) é a mais representativa de Tarsila desse período e, de acordo com Nádia, já anunciava o antropofagismo.
Segundo a atora, na estadia europeia, Tarsila manteve o contato com o grupo modernista brasileiro, por correspondência. “É o caso das cartas que trocou com Mário de Andrade”, afirma. Nelas, expressava o desejo de se tornar a pintora de sua terra, amalgamando em sua obra o ambiente rural da infância vivida em Capivari, interior de São Paulo.
No intercâmbio cultural, a conexão não se deu apenas em Paris. A amizade com o poeta globe-trotter Blaise Cendrars se estreitou, e o arauto do modernismo acabou ensejando uma viagem de descoberta do Brasil e sua cultura popular que se mostraria seminal da poesia Pau-Brasil. “Na trilha artística da pintura e do desenho, Tarsila abriu alas para a literatura. Definiu direções do movimento Pau-Brasil, que se consolidou nas viagens da caravana paulista, de que participou Cendrars, quando cumprem um programa de destaque na história do turismo no nosso país: passam o Carnaval no Rio de Janeiro e a Semana Santa nas cidades históricas de Minas Gerais”, resume Nádia.
De troca em troca, a primeira exposição de Tarsila em Paris, em 1926, realizou-se com o apoio de Cendrars. E também foi ela que apertou o play da antropofagia, ao presentear Oswald de Andrade com o quadro Abaporu (1928). Sobre a figura representada escreveria dez anos depois no artigo Pintura Pau Brasil e Antropofagia, publicado na Revista Anual do Salão de Maio, nº 1: “O Abaporu impressionou profundamente. Sugeria a criatura fatalizada, presa à terra com seus enormes e pesados pés. Um símbolo”.
Em textos e imagens, biografia renova
olhar sobre vida e obra de Tarsila do Amaral
Lançado na Festa Literária Internacional de Paraty e na Bienal do Livro de São Paulo 2018, Tarsila do Amaral: A Modernista (Edições Sesc São Paulo) é a biografia escrita pela professora e ensaísta Nádia Battella Gotlib, que renova o olhar sobre o legado da artista, recriando sua trajetória libertária, por meio de fatos da vida íntima, formação artística, circuito modernista, movimento Pau-Brasil e a Antropofagia. Dividida em oito capítulos, a publicação reforça em textos analíticos, poemas, imagens, trechos de cartas, cronologia e referências bibliográficas o potente arsenal criativo e pessoal de Tarsila.