Postado em 22/08/2018
Com o Sesc Jazz a pleno vapor, a gente não cansa de dizer que o gênero está longe de ser um programa só para “quem entende do assunto”. Afinal, a beleza da música é que todo mundo pode curtir um show, descobrir novos sons. Pensando nisso, convidamos uma millennial para descrever a experiência de seu primeiro show de jazz! A seguir, a paulistana Malu Mões, 20 anos, conta como foi assistir ao show do cubano Omar Sosa, 53.
Uma pausa para tempos musicais diferentes
Por Malu Mões*
Olho no meu celular, ele grita 21h31. Como estou acostumada com a pontualidade do local, acelero para tentar não perder nenhum segundo do show. Depois de uma semana cheia de demandas da vida pessoal-universitária-profissional, me sinto sem energias para essa corrida, mas me esforço mesmo assim. Entrego o ingresso com os escritos “Omar Sosa (Cuba) – Sesc Jaz 2018” a tempo de ouvir as primeiras notas do piano serem tocadas.
Preocupada em encontrar o amigo que me espera, não me concentro na melodia. Independente da atenção que meus pensamentos dão a ela, a música começa a surtir sensações no meu corpo. Os músculos tensos de meu ombro se aliviam, como se os dedos do pianista Omar Sosa os massageasse por meio de seu som. Meus passos – normalmente, agitados – diminuem de ritmo, harmonizando-se com o compasso do músico. Quando encontro meu amigo, segurando dois lugares em uma mesa no meio da multidão, todo meu corpo já está imerso nos efeitos do jazz.
As notas, que ganham vida nas ágeis mãos de Sosa, chamam o próximo músico a entrar. Um por um, o instrumento de cada um deles chama o próximo, até o quarteto estar completo no palco iluminado. Eles não usam palavras para se apresentar. Não é necessário, o som deles cumpre essa missão. José Julio Tomás, o baixista, é o segundo a compor nessa apresentação. Seguindo-o, Ernesto Silveiro Simpson senta-se em frente à sua bateria e dá boas-vindas ao público. Leandro Saint-Hill não demora muito para trazer seus instrumentos de sopro para o arranjo. O grupo está completo. O público, extasiado, vibra acompanhando a velocidade das batidas, que se tornam mais agitadas.
Entre gritos eufóricos de “Viva Cuba”, o gênero musical se mistura com as latinidades do grupo. Ouvidos acostumados com o jazz que toca em cafeterias, restaurantes e até no metrô da capital paulista talvez estranhassem o som tocado pelo quarteto. As veias da América Latina pulsam em suas músicas. É um show alegre, movimentado, que exalta as raízes afro-cubanas do grupo. Eles entoam – em suas vozes e instrumentos – o sotaque latino.
A palavra “bailando” é cantada por Leandro Saint-Hill, chamando a plateia – que, mesmo contida em suas cadeiras, já se balançava no ritmo das músicas– para se levantar. Todos levantam. O público aparenta ter, em sua maioria, entre 30 e 50 anos. Eu e meu amigo, com nossos 20 e 18 anos, nos destoamos um pouco. Não procuro muito, mas não vejo ninguém com uma idade próxima à nossa. Isso não o impede de me puxar para dançar, assim como muitos outros faziam. Meus passos desajeitados e desacostumados com o gênero – era meu primeiro show jazz – me fazem esbarrar em algumas pessoas ao meu redor. Isso não as incomoda.
A apresentação brinca com o íntimo e o extrovertido. Ela puxa a energia do público para dançar, trazendo-o para perto e girando-o entre as mudanças de andamento das composições. O público gargalha com as interações naturais que surgem dos músicos. Omar Sosa mostra suas habilidades como dançarino, exibindo que não é só a Anitta que sabe requebrar. Olho para os lados, a plateia está radiante. É perceptível a sensação de que todos que estão ali estão embebidos de jazz.
Esqueço a lista de trabalhos da faculdade, o coração partido, as preocupações financeiras e todos os problemas do futuro. O show me puxa para o presente. A música ao vivo grita e faz todos que estão lá permanecerem no aqui e agora. É ao vivo, criado especialmente para esse espaço-tempo. Não é algo sintético, que possa ser apreciado em outro horário e lugar. É uma brecha na correria para que se desfrute do prazer desse momento único. Nesse instante só sou energia. A mesma energia que os dedos de cada um dos músicos usa para criar sua arte.
* Malu Mões é estudante de jornalismo da Faculdade Cásper Líbero e estagiária de Comunicação no Sesc Pompeia.