Postado em 10/08/2018
* Por Dulce Ferreira
Nasci na década de 50.
Nascer na década de 50 foi presente.
Assisti de olhos arregalados, alma agradecida e cabeça confusa, a chegada de Gil, Caetano, Tropicália, Chico, e tantas outras aparições pra me fazer pensar. Descobri Guimarães Rosa, Wilhelm Reich com seu “A Função do Orgasmo”, que ficava escondido embaixo da cama. E tantos, tantos outros. Riquezas!
Vivi também os tempos da Ditadura. Tristezas!
Com os motores potentes cheguei aos vinte anos, querendo fazer tudo, e depressa!
Aprender, amar, explorar, fugir de ideias retrógradas de feminilidade, realizar. Achar um companheiro e ter um filho.
Década de setenta, mulheres como eu eram as mutantes de minha geração.
Não admitíamos a ideia de terminar como a mulher caseira, com a carreira no mundo dos sonhos, como tantas desorientadas e infelizes que conhecíamos. Conseguimos. Chegamos aos trinta anos com uma crise diferente: algo tinha de ceder.
A maioria ou eliminava o casamento, ou apostava na carreira, ou renunciava aos filhos! Algumas não conseguiram, ficaram submergidas e não deram um passo adiante. Chegamos à liberdade de escolha, aos enfrentamentos, ao divórcio.
Surgem os pais de final de semana, e com eles uma responsabilidade desconhecida, afinal nunca trocou fralda, deu remédio. Tiveram que aprender.
A próxima etapa, que gosto de chamar de “passagem”, é quando você se dá conta que o tempo está passando depressa demais, ele tem que ser vencido. Posso realizar tudo que sonhei antes que seja tarde demais?
Essa etapa passa, e você fica expert em antidepressivos, conhece todos!
Chega-se então à idade em que você, carinhosamente, é chamado de Preferencial.
Fase confusa, pois você entra numa fila própria para pessoas com sessenta anos e “ninguém” te questiona, apesar de você não entender o porquê!
Hoje já não lembro onde coloquei os óculos, mas que bom que ainda os procuro, porque leio. Estou viva, lúcida, preocupada com o futuro, discutindo política calorosamente, atuando nas manifestações contra o racismo, contra a desigualdade, contra o machismo absurdo, contra a violência que sofrem as mulheres...
Assim, desse jeito, cheguei aos sessenta, inteira, ativa e cheia de opinião, sem modéstia, me sentindo a própria Madonna. Só não danço, casei menos vezes, sou muito desafinada, mas o brilho da idade, ah o brilho! Igualzinho!
* Dulce Ferreira é contadora de causos
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Quatro personalidades distintas descrevem a influência do ícone Madonna em sua vida profissional e pessoal. A produção textual resulta em um ebook que integra a programação do especial "Madonna, Sexagenária".
Leia também:
> Bitch, She’s Madonna!, por Murilo Gussi, ator e diretor Teatral
> Hei, Brasil. Vamos pimbar!, por Harlen Félix, ator e jornalista
> O lado negro da força, por Anna Claudia Magalhães, artista visual e escritora
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