Postado em 11/08/2017
Ela (ou seriam elas?) caminha vagarosamente: é uma atriz e uma boneca. ‘Enfaixadas’, coladas uma a outra, é visível que se trata de uma intervenção artística. Cheio de curiosidade, o público se aproxima: as crianças com certo receio seguido de risos e os adultos intrigados. Aos poucos os risos dão lugar a um breve silêncio rompido por um murmurar de questionamentos e conclusões precipitadas: “Ela tá grávida? Ela tá chorando? Ajuda ela. Tá mexendo a barriga dela. Quem tá sofrendo aí? Eu acho que no final ela morre, concorda? Eu acho! É, mas não se estivesse num hospital.” . É Maiêutica, de Raquel Mützenberg.
A performance se inicia com os olhares atentos. A atriz se movimenta como se estivesse com algum problema, com dor. É uma boneca em trabalho de parto, mas não é um parto comum, ela não dá à luz a um outro ser, é um partejar de ideias, uma das formas que a boneca encontrou de se reinventar: parindo a si mesma. “O corpo é recurso material e plástico, que se deixa dividir ou multiplicar pelas subjetividades femininas: a capacidade de renascer de si mesma.”
A intervenção surgiu após uma pesquisa acadêmica em nível de Mestrado no Programa de Pós-Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea (UFMT). O material cênico foi coletado a partir do contato com gestantes, parturientes, doulas, notícias jornalísticas e discussões de grupos sobre parto humanizado, violência obstétrica e misoginia.
Criada com realismo que impressiona, a boneca foi construída durante o Laboratório Plan B, orientado pela bonequeira russa Natacha Belova. Raquel conta que foi um desejo que sempre teve de expressar vários afetos e compartilhar um pouco da própria pele com a boneca. “Era uma vontade que eu tinha de viver um boneco que eu pudesse ser uma parte dele. Eu venho do mundo dos bonecos e a Maiêutica foi uma experiência minha no mundo das ideias.”
“A verdade latente em todo ser humano contrai, abre, dilata, cede, fecha e esperneia”
Maiêutica é um conceito Socrático, é o momento do "parto" intelectual. Sócrates conduzia este processo levando os interlocutores a questionarem o seu próprio conhecimento, fazendo com que concebessem uma nova opinião sobre o assunto, com o objetivo de ajudar o indivíduo na busca pela sua verdade interior, auxiliando a chegar às suas próprias ideias.