Postado em 29/06/2017
O nascimento do design gráfico brasileiro é tardio, datando da chegada da corte à colônia no século 19, mas de lá para cá a criação na área fincou raízes e amadureceu
Em comparação a outros países latino-americanos, o nascimento do design gráfico brasileiro mostra-se razoavelmente tardio, tendo 1808 como seu ponto de partida. Antes disso, era proibida a feitura de qualquer material impresso na colônia, panorama alterado com a chegada da corte portuguesa. Naquela época, a tipografia de chumbo (inventada por Johannes Gutenberg), seus tipos e ornamentos tinham destaque.
O design como linguagem sofreu transformações ao longo dos séculos 19 e 20 no Brasil, até chegar à vertente modernista, que começa a tomar forma na 1ª Bienal de São Paulo (1951), desde o simbolismo do cartaz de divulgação, feito pelo artista Antônio Maluf. A linguagem é adotada pelo Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM), que passa a ser uma vitrine do design gráfico e propulsora de sua disseminação.
As artes dos cartazes das bienais abriram diálogo com os poetas, os quais se apropriavam desses eventos para atividades performáticas. Ecoando na imprensa, durante os anosde 1957 e 1958, poetas usaram o suplemento dominical do Jornal do Brasil como plataforma. Ferreira Gullar motivou essa relação, já que trabalhava na seção de artes plásticas. Em conversa com o coordenador da publicação, o jornalista Reynaldo Jardim, o poeta sugeriu que o Suplemento se tornasse o veículo do movimento concretista, em busca de novas linguagens.
Professor da Pós-Graduação em Design da ESDI (Escola Superior de Desenho Industrial da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – Uerj), João de Souza Leite faz um paralelo e conta que o concretismo paulista funcionou como caixa de ressonância “para ideias cujas influências remontam, em linhagem conceitual, à sequência de eventos que encadeiam a tradição iniciada pelos construtivistas russos. O concretismo deu continuidade à ênfase na construção, na estrutura, no projeto – naquilo que se afasta razoavelmente da execução e está podendo ser repassado a outra instância”.
UM DESIGNER BRASILEIRO
Uma figura importante do design nacional que também passou a atuar na imprensa foi Tide Hellmeister. Nascido em 1942, o artista gráfico e ilustrador de formação multifacetada, começou na área como assistente do cenógrafo Cyro Del Nero na TV Excelsior e aprendeu noções de pintura e desenho com o pintor João Suzuki.
O ímpeto de experimentação resultou em seu envolvimento com projetos inovadores, entre eles a reformulação gráfica do Jornal da Tarde, em 1966. “Assim, aos vinte e poucos anos, Tide havia se familiarizado com princípios da arte e do design modernos – ainda que por caminhos pouco usuais e nada formais”, indica Paulo Miyada, curador da exposição sobre Hellmeister (morto em 2008) no Sesc Bom Retiro (veja abaixo em 'Resgate Visual').
Da imprensa diária para as editoras, Hellmeister trabalhou nos anos 1960 com o editor paulista Massao Ohno, pioneiro no segmento e influente editor de livros de poesia. Livros de Graciliano Ramos também estamparam na capa o pensamento visual de Hellmeister, assim como capas de discos, as quais mesclavam ousadia e autoralidade. Essas eram marcas de seu trabalho expresso em colagens e no campo editorial, que foi renovado por suas criações.
Miyada enfatiza ainda que, na atuação de Hellmeister, as experimentações plásticas e as produções gráficas coexistiam no tempo e no espaço. “Essas atuações nunca foram separadas segundo hierarquias lineares – ainda que a parcela gráfica fosse a responsável por manter suas contas em dia –, mas alimentavam-se mutuamente e compartilhavam certa visualidade ou, talvez, um programa experimental”, complementa.
RESGATE VISUAL
Exposição com os primeiros trabalhos do artista Tide Hellmeister leva a público um universo de colagens, projetos de livros e criações feitas para jornais e revistas
De 20 de julho até 31 de outubro, o Sesc Bom Retiro sedia a exposição Tide: Cota Zero, composta dos primeiros trabalhos do artista paulistano Tide Hellmeister, produzidos entre os anos 1960 e 1970.
O público terá acesso à produção inédita, que abrange colagens, design de livros e artes feitas para revistas e jornais.
Curador da exposição, Paulo Miyada enfatiza que, apesar das confluências com o design moderno, pode-se dizer que Tide respondeu a seu tempo sem se submeter a ele. “O maior legado dessa primeira fase de Tide Hellmeister, sua contribuição talvez pouco consciente que se apresenta como um soluço histórico no arco de implantação do design moderno no Brasil foi o exercício pleno de sua arbitrariedade gráfica”, diz Miyada.
No começo da década de 1970, Hellmeister foi diretor de arte no Sesc São Paulo e responsável pelo projeto editorial da revista Problemas Brasileiros.
Confira mais detalhes sobre a exposição
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