Postado em 30/03/2017
Instrumentista premiado e internacionalmente reconhecido, Cristóvão Bastos conta suas experiências como arranjador musical
Foto: Alonso martinez
Compositor, pianista e arranjador, o carioca Cristóvão Bastos iniciou a carreira aos 17 anos, assim que se formou em teoria musical e em acordeom, instrumento que estudava desde a infância. Nascido em 1946, coleciona prêmios e parcerias. Ganhador de oito Prêmios Sharp, foi indicado ao Grammy Latino em 2011. Já trabalhou em arranjos para os amigos Chico Buarque, Paulinho da Viola, Aldir Blanc, Nana Caymmi, Edu Lobo e Gal Costa. Participou da primeira formação da banda Black Rio, em 1976. Também emprestou seu talento ao cinema, fazendo a trilha de filmes como Zuzu Angel (Sérgio Rezende, 2006) e Não se Preocupe, Nada Vai Dar Certo (Hugo Carvana, 2011) – orquestrando as letras compostas por Edu Lobo –, e acaba de concluir a trilha para o documentário Querido Embaixador (Luiz Fernando Goulart), com estreia prevista para este ano.
Nesta conversa com a Revista E, o instrumentista conta como funciona seu trabalho como arranjador e qual instrumento mais gosta de tocar.
O rumo da música
O arranjo musical pode começar dentro do estúdio, mas normalmente é feito fora e pensado com bastante calma, costuma surgir numa conversa que temos com o artista e o produtor. A partir dessa conversa definimos que rumo vai tomar a música. Podemos dizer, de forma direta, que o arranjo é do arranjador, claro, mas o fazemos para a obra de outra pessoa. O arranjador se torna um coautor, porque rearmoniza a música, acrescenta uma introdução harmônica que não havia etc. É um tipo de parceria, mas não acho que seja um processo difícil. Já aconteceu de eu fazer um arranjo, chegar ao estúdio e o produtor me dizer que estava muito bonito, mas gostaria de ressignificar, transformar o que criei em algo diferente. Agi dessa forma, transformei para algo mais próximo da linguagem do artista e ficou tudo certo. Então não é uma relação espinhosa. Difícil é quando não conheço o artista e tenho que criar o arranjo, pois conhecendo e conversando posso criar sobre uma base sólida. É importante que haja um pouco de cumplicidade com o artista, prestar atenção no pensamento e posições dele, para conseguirmos obter uma unidade. Arranjar é colocar em ordem as coisas básicas da música, harmonia, melodia e ritmo, e é isso que me atrai. É também apresentar ideias novas, a sua visão e experiência sempre em função da obra a ser mexida. Com o passar dos anos, a experiência aumenta e isso é bom, mas é necessário manter a mente fresca e receptiva para as novas cores que aparecem.
Piano, violão e parcerias
Parceria é uma atividade que enriquece o nosso discernimento, por causa da troca de ideias. Pode acontecer com um letrista, com outro músico – tenho melodias com Paulinho da Viola, Mauricio Carrilho, Luciana Rabello, João Lyra, que não receberam letras –, e também como arranjador, o que normalmente nos torna um coautor. Uma parceria marcante em minha carreira foi com a Black Rio [da qual Cristóvão é um dos fundadores] na primeira formação do grupo e, também, do primeiro álbum, Maria Fumaça (1976). Para mim, é um disco raro, fruto de uma dedicação e uma entrega fantásticas de um grupo de músicos extremamente cúmplices, ou seja, parceiros. Todos opinaram e trabalharam unidos e o resultado foi realmente um marco na música instrumental. Satisfação imensa ter no meu currículo esse momento especial.
O piano é o instrumento que eu mais gosto de tocar. Comecei com acordeom, estudei violão por conta própria, além de flauta e trompete, mas me fixei profissionalmente no piano. Tem uma coisa interessante, às vezes trabalho harmonias com o violão e também componho. Em vários arranjos de samba eu prefiro o violão, por causa da cadência. É um instrumento suingueiro, o condutor do groove. No caso do samba, gosto de usar o piano como complemento. Duas músicas minhas bastante conhecidas, Todo Sentimento e Resposta ao Tempo, devo ao violão!
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