Postado em 23/03/2017
(1) João Farkas
A vida tem me levado a viajar muito e ter bastante contato com comunidades rurais. No litoral da Bahia, na Amazônia e no centro-oeste, no interior de São Paulo, Minas ou Paraná o que sempre me chama a atenção é que se envelhece com mais dignidade. Às vezes com muito menos recursos, em situações mais despossuídas, mas com pertencimento. Com integração com o entorno e com maior grau de aceitação pela comunidade, envelhecer faz parte da vida. Os velhos envelhecem como as árvores crescem, os rios mudam de curso, as marés se alternam e os animais morrem. Perto da natureza envelhecer não é tornar-se inútil.
Não é preparar-se para o descarte. É diminuir o ritmo e aceitar limites que às vezes vem junto com sabedoria, às vezes com graça. Minha impressão geral é que junto à natureza envelhecer é... natural! Faz parte. Talvez um dos motivos disto seja que nestas comunidades o sedentarismo praticamente inexiste. Assim como nas cidades, aqueles que se mantém ativos e cri-ativos nos passam uma sensação de vitalidade superior aos que simplesmente abandonam o barco da vida. É preocupante que nos últimos 60 anos o Brasil deixou de ser uma sociedade predominantemente rural, não apenas na divisão dos habitantes, mas principalmente na configuração da '"alma" e dos valores nacionais. Muita coisa se ganhou, mas muita coisa se perdeu. Uma delas foi o espaço de convivência, aceitação e respeito ao outro, à natureza e ao nosso próprio envelhecimento. Cuidar da velhice, conviver naturalmente com ela, encontrar o papel dos que estão mudando de ritmo é tarefa humanizadora das mais fundamentais numa sociedade que se brutaliza pelo imediatismo, pelo culto à aparência e ao sucesso, caminhando para a intolerância do que é verdadeiro.
(1) Nasceu em 1955, em São Paulo, Brasil Graduou-se em Filosofia pela Universidade de São Paulo. Sua formação como fotógrafo deu-se no ICP - International Center of Photography e na School of Visual Arts, em Nova York . Trabalhou como correspondente fotográfico para diversas revistas como Veja e Isto é. Foi colaborador e teve trabalhos publicados na imprensa brasileira e internacional. Seu trabalho-documento “Retratos da Ocupação da Amazônia” recebeu a bolsa Vitae e o Prêmio Aberje em 1988 e foi publicado pela Editora Madalena/Edições Sesc em 2015. De Trancoso ao Espelho da Maravilha” serviu como base para publicação de dois livros: “Museu Aberto do Descobrimento”, "Nativos e Biribandos” e foi publicado em 2016 pela Editora Cobogó.