Postado em 21/11/2016
A Turquia é um país históricamente musical. A península da Anatólia, onde está situado o país é um dos pedaços de terra mais antigos a serem habitados na história da humanidade, desde o neolítico, para se ter uma ideia: o assentamento de Tróia foi fundado nesta época e habitado até a à Idade do Ferro.
Dentre os povos que habitaram esta península, estão os Frígios, os Lídios, o gregos Eólios e Jônicos - pra quem sabe um pouquinho de música, esses povos dão nome a alguns dos modos gregos que aprendemos lá na iniciação musical quando nos falam dos primórdios da música e do improviso.
O povoamento da península de Anatólia por dóricos, jônicos, eólios e lídios
Istambul, por si só, já é uma cidade curiosa e com muita história: no ano de 324, depois de ter sido conquistada por Alexandre, o Grande e testemunhar a queda do seu império em vários pequenos reinados, era chegada a vez do império romano tomar conta. Constantino I, imperador à época, escolheu Bizâncio para a capital do império, rebatizando a cidade por Constantinopla. Séculos se passaram até a posterior divisão do império romano e a criação do império Bizantino que durou até o século XV, quando os otomanos tomam Constantinopla num episódio que é encarado como fim da idade média - tudo isso aconteceu na Turquia.
Além do simbolismo, a presença dos Otomanos na terra desencadeou uma onda de moda e cultura que varreu a Europa do século XVI ao XVIII, a Turqueria. Balizada pela aliança franco-otamana, celebrada entre o rei Francisco I da França e o sultão Suleiman, o magnifico, este acordo de bases militares e comerciais, estabeleceu uma ponte institucional entre o ocidente e o oriente, não sem tropeços, é claro.
Francisco I e Suleiman, o Magnífico
Data do século XVII a história de Suleiman Aga, embaixador do império otomano em Versalhes, sede do governo francês, onde o monarca Luís XIV, o rei Sol, mantinha toda a corte francesa. Dizem que Suleiman vestia apenas um casaco de lã, tendo a pele nua abaixo e recusou-se a prestar reverência ao rei francês, uma vez que seu rei era o sultão turco. Imediatamente banido para Paris, Suleiman teve em sua residência o local de divulgação da cultura turca, com as tapeçarias, os turbantes e, mais importante, o café!
A história do café, como muito se imagina, não remete a Europa, nem a Ásia, mas sim a Etiópia onde de lá se difundiu para o mundo através do Egito e da própria Europa.
Uma lenda conta que um pastor chamado Kaldi observou que seus carneiros ficavam mais espertos ao comer as folhas e frutos do cafeeiro. Ele experimentou os frutos e sentiu maior vivacidade. Um monge da região, informado sobre o fato, começou a utilizar uma infusão de frutos para resistir ao sono enquanto orava. Parece que as tribos africanas também, que conheciam o café desde a antiguidade, moíam seus grãos e faziam uma pasta utilizada para alimentar os animais e aumentar as forças dos guerreiros.
Nem o pastor, nem o monge estavam tendo alucinações ou mesmo estavam chapados por outra planta facilmente encontrada em regiões montanhosas. A cafeína chega às células do corpo em menos de 20 minutos após a ingestão do café. No cérebro, a cafeína aumenta a influência do neurotransmissor dopamina, responsável pelo controle de, entre outras coisas, movimentos, aprendizado, humor, emoções, cognição e memória - curioso pensar que aquele cafezinho que tomamos diariamente contenha tanta história, não? Mas há mais!
Reza a lenda, inclusive, bem rezada pois tem papa no meio, que, no século XVII, vários padres italianos pediram ao papa Clemente VIII que proibisse o consumo de café, então considerado uma "bebida projetada por Satanás para os infiéis".
O papa, muito prudente, quis conhecer melhor a situação e pediu um café para provar. Após provar um café da melhor qualidade, sua santidade declarou: “Pois bem. Esta 'bebida de Satanás' é tão deliciosa que seria um pecado deixá-la somente para os infiéis. Enganemos Satanás batizando-a!”
Clemente VIII curtindo seu cafezinho
Quem assistiu a um concerto na vida, provavelmente deve ter colocado as sinapses à prova aumentando os níveis de dopamina no cérebro, assim como numa golada de café forte. Escutar música clássica com frequência ativa os genes associados à função cerebral e ajuda a prevenir as doenças neurodegenerativas, segundo um estudo divulgado por cientistas da Universidade de Helsinque, na Finlândia.
Deve ser por isso que encontramos termos tão peculiares relacionados as duas culturas. Sobrasse complexo, moagem, afrutado, aromático, madeirado, descafeinado de um lado; como adagio, allegro, cantata, minueto, entre outras; no outro. O café, assim, como a música de câmara tem uma história técnica.
Apostando nesta conversa de dinastias e culturas, o Pera Ensemble veio ao Brasil no Festival Sesc de Música de Câmara, apresentar o espetáculo "Café: o oriente encontra o ocidente". "Pera", é o nome de um milenar bairro de Istambul, no qual uma miríade de culturas e religiões coexistem. o grupo reúne, desta forma, especialistas da música antiga europeia e a elite da música turca - trata-se de uma oportunidade única para ver instrumentos antigos e diferentes da nossa vida cultural, como o ood e o derbak só para ficarmos nos mais conhecidos. Uma pequena amostra no vídeo abaixo ;)
Transmissão online e espetáculo infantil
O Pera Ensemble se apresentou no Sesc Consolação, com transmissão ao vivo, que virou programa inédito do SescTv, com estreia em 31 de março.
Além desta data, o grupo tocou no Sesc Araraquara e no Sesc Santo André. No Sesc Sorocaba e no Vila Mariana, o espetáculo foi para as crianças: O Café para o Rei, conta a história da paixão do rei Teodoro pela bebida e terá a participação da contadora de histórias Carla Candiotto.
Além destas datas, o grupo tocou no Sesc Araraquara e no Sesc Santo André. No Sesc Sorocaba e no Vila Mariana, o espetáculo foi para as crianças: O Café para o Rei, conta a história da paixão do rei Teodoro pela bebida e terá a participação da contadora de histórias Carla Candiotto.
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A segunda edição do Festival Sesc de Música de Câmara acontece entre 22 de novembro e 4 de dezembro de 2016, em 11 Unidades do Sesc na capital, interior e litoral, além de espaços como a Igreja Nossa Senhora da Boa Morte, no centro de São Paulo e o Museu Afro Brasil, no Parque do Ibirapuera. São 12 conjuntos convidados, 47 concertos e uma intervenção, mais de 120 intérpretes, em repertórios que vão do antigo ao contemporâneo, em abordagens inovadoras. Para conferir a programação completa, clique aqui.