Postado em 28/10/2016
por Mauro Maldonato
Escritor e psiquiatra italiano propõe diálogo entre temas políticos, culturais e éticos em novo livro
Com formação em psiquiatria, o italiano Mauro Maldonato construiu uma trajetória sólida que tem como pilares o pensamento teórico sobre temas do universo cultural e intelectual, a pesquisa acadêmica e a publicação de livros.
Atualmente é professor de psicologia geral na Universidade della Basilicata, na Itália, mas já atuou como professor visitante na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), na Universidade de São Paulo (USP) e na Duke University, nos Estados Unidos, onde dirige o Cognitive Science Studies for the Research Group.
Esteve no Brasil com a agenda cheia para divulgar seu novo livro, Na Base do Farol Não Há Luz: Cultura, Educação e Liberdade (Edições Sesc, 2016), participando de encontro durante a Festa Literária de Paraty e de bate-papos nas unidades do Sesc Consolação, Campinas e no Centro de Pesquisa e Formação (CPF).
Além dos textos de Maldonato, o livro conta com a participação do diretor regional do Sesc São Paulo, Danilo Santos de Miranda, que assina a apresentação e oferece reflexões sobre os mesmos temas, mas do ponto de vista da realidade brasileira.
Começo pela metáfora
O título do livro (Na Base do Farol Não Há Luz) tem uma conotação metafórica, derivada de um antigo provérbio chinês que foi recuperado pelo filósofo marxista alemão Ernst Bloch, por exprimir de forma clara que a racionalidade e a história têm sempre um aspecto “acima e abaixo no mundo”, ou seja, contradições, problemas, conflitos que não chegam à superfície. A razão desse pensamento evidencia-se, também, na representação poética que ele fez do comportamento humano, seus conflitos políticos e ideológicos. Ele se referia a uma corrente que sempre atravessa a vida do homem e que, de alguma forma, entra em conflito com a superfície da história.
Leitores online
Cada post que escrevo no meu site é espontâneo (http://mauromaldonato.net/) e relacionado aos meus pensamentos no momento, não sigo uma programação definida sobre o que devo escrever ou qual tema abordar.
Quando me ocorrem ideias que considero que podem ser compartilhadas nesse canal, publico no meu site. Os textos são mais curtos, pois as pessoas que acessam as redes nesse contexto não se prendem a leituras muito longas, diferentemente do que acontece quando nos propomos à leitura completa de um livro, que é um texto mais complexo em argumentação. Levo em conta essas diferenças na hora de escrever, mas não existe fio condutor que harmonize os textos dos posts.
Às vezes, menciono algum artigo científico que li, achei interessante e pode ser relacionado com a vida cotidiana. Os paradigmas do meu pensamento e da minha pesquisa acadêmica podem ser relacionados à esfera das decisões, à esfera das decisões políticas e às implicações do uso da racionalidade humana.
Polarizações
A polarização das opiniões não é uma questão exclusiva do momento brasileiro. Isso está acontecendo em todo o mundo, numa radicalização das retóricas da intransigência e na incapacidade crescente de escutar o que o outro tem a dizer – situação que, para mim, é um problema a considerar.
Há muitas razões na síntese dessa questão. Podemos apontar as consequências dos problemas políticos, econômicos e todas as promessas não mantidas pelos governantes, por exemplo, porque a classe dirigente, depois de alguns fracassos históricos e de vivenciar duas guerras mundiais e a guerra fria, ainda se pergunta qual modelo institucional deve seguir. As classes dirigentes do Ocidente fizeram a opção liberal, que foi um desentendimento, porque as pessoas não entenderam qual o ponto de chegada das contradições do século passado. É como se esses conflitos não tivessem acontecido. Essas razões somadas a outras que tratei no livro são a raiz do enlouquecimento do mundo atual.
Poder de decisão
Vivemos um período da história em que há um complô contra a decisão. Penso que há um excesso de mediação em nossas ações. É preciso conhecer os problemas, sobretudo os psicológicos, que estão nas raízes da decisão. A dificuldade em decidir não deriva apenas de falta de maturidade, porque ao decidir você sempre está em frente a uma via dupla, uma dupla escolha. Há um equilíbrio muito frágil entre as nossas emoções e a nossa racionalidade. Numa época em que a decisão é ameaçada por um verdadeiro complô intelectual, como ressalta a tendência geral para a mediação e o compromisso, é absolutamente central discutirmos o tema.
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