Postado em 01/08/2001
Maria Angela de Almeida Souza
é professora do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Pernambuco
A formação patriarcal que definiu durante séculos a sociedade nordestina e que continua a defini-la nas áreas menos asfaltadas da região, expressou-se na moradia inicialmente através da casa-grande com a senzala (Gilberto Freyre, Casa grande e senzala), que na área rural exprimia as relações estabelecidas entre o senhorio português e os escravos africanos. Com suas grossas paredes de taipa ou de pedra e cal, com seus alpendres na frente e nos lados, e com seus telhados de telha-vã, caídos ao máximo para proteger contra o sol forte e as chuvas tropicais, as casas-grandes não foram reprodução das casas portuguesas, mas uma expressão nova, derivada do ambiente físico nordestino, em que o imperialismo português desenvolveu sua atividade agrária nos trópicos.
Com uma arquitetura que adquiriu dos conventos certa simplicidade mas também valores e recursos técnicos, as casas-grandes se compunham de várias salas e quartos, corredores, cozinhas, despensa, capela e puchadas. Foram fortaleza, banco (com tesouros guardados nos pisos), cemitério (com os mortos sepultados na capela), hospedaria e escola. As senzalas complementavam as casas-grandes, com seu correr de quartos, onde se amontoavam os escravos. Ao lado se localizavam as estribarias, a horta e o jardim, formando um complexo de moradia que condicionou as relações entre brancos e pretos, pais e filhos, mulheres e maridos, na fase inicial de desenvolvimento da sociedade nordestina.
As casas de sítio - as chácaras - marcaram, posteriormente, a transição desse tipo rural de habitação nobre para o urbano. Era a casa-grande sob a forma de casa nobre da cidade, que, mais restrita nas suas funções, servia de veraneio, consolidando os arrabaldes da cidade como residência das famílias abastadas.
Na área urbana, propriamente, os sobrados em contato com a rua, com a matriz, com o mercado, abrigavam, desde o início das cidades, as famílias que viviam das suas atividades ou as sedes urbanas dos proprietários rurais. Expressavam, também, as distâncias sociais entre o senhor e o escravo, entre o branco e a gente de cor. Nesses sobrados, as "senzalas" tornaram-se "quartos para criados" ou "dependências", ainda presentes nas moradias de nossas cidades como resquícios de nosso passado escravocrata. Mas, enquanto as "senzalas" diminuíam de tamanho, cresciam as aldeias de mocambos, que se espalhavam pelas zonas de menor valor das cidades.
Salvador, desde o século 16, caracterizou-se pela rua comprida e larga, povoada de casas que se fechavam contra a rua, dentro de seus quintais com coqueiros carregados e árvores de pomar (Gabriel Soares de Souza, Notícia do Brasil, cap.VII). No Recife, que se desenvolveu sobre ilhas, os seus sobrados, por questões de espaço, fechavam-se em si mesmos, às vezes com a frente, outras vezes com as costas voltadas para o rio. A tradição da arquitetura holandesa, que condicionou o desenvolvimento do Recife, consagrou aquele sobrado mais estreito e mais alto, comparados aos baianos (Gilberto Freyre, Sobrados e mocambos). As características arquitetônicas dos sobrados portugueses se impuseram, contudo, em Salvador, em São Luís, mas também no Recife, após o século 17, bem como em outras cidades nordestinas que ainda hoje preservam exemplares dessa arquitetura em seus centros históricos.
Enquanto os sobrados europeus precederam os sobrados das cidades nordestinas, a casa nativa da Angola precedeu os mocambos nas áreas pobres da região. Em geral pequeno, e muitos deles com um só vão, os mocambos se construíam com material que variava com a diversidade da vegetação dentro da paisagem regional. Os tipos mais comuns eram aqueles de paredes de taipa, de madeira ou de palha trançada, com telhados de palha. Quando localizados nos alagados e nos manguezais, se elevavam sobre palafitas e seus moradores se alimentavam da fauna desses alagados, passando a viver numa estreita dependência deles, num processo que Josué de Castro denominou de "ciclo do caranguejo" (Josué de Castro, Geografia da fome).
A partir da segunda metade do século 20, novas expressões de moradia se estabelecem. Os "arranha-céus" substituem os sobrados e as casas de arrabalde. Os mocambos se adensam em favelas que sobem morros e aterram alagados. Grande parte deles substituiu suas paredes de taipa, madeira ou palha por alvenaria, e sua cobertura por telhas cerâmicas. Contudo, sua presença ao lado dos arranha-céus expressa a distância social que se agrava entre o rico e o pobre.
Carlos Augusto dos Santos
é pesquisador do Instituto de Estudos sobre a Amazônia e da Fundação Joaquim Nabuco
A ausência de instituições de ensino voltadas exclusivamente para a reflexão e o pensar sobre a forma da ocupação do espaço urbano e mesmo da construção de moradias nas cidades, de seus prédios e por conseqüência do bem-estar daqueles que residem na região Norte, e sobretudo aqui no estado do Amazonas, faz com que esse contingente populacional viva no presente, como viveu no passado, a partir de cópias, modelos e transposições de projetos arquitetônicos que nem sempre correspondem às verdadeiras necessidades da população amazonense.
Historicamente, no estado do Amazonas a arquitetura mais representativa é aquela de sua capital, Manaus, que vai, de um modo ou de outro, resumir e espelhar não apenas o que pode ser encontrado em maior ou menor escala no interior do estado mas, também, ser absorvido por meio das diferentes escolas arquitetônicas assimiladas ou mesmo desenvolvidas no país.
É desse modo que o fausto e a riqueza do período da borracha vai legar à cidade de Manaus as construções que levam a assinatura do movimento da Belle Époque e que estão presentes nas fachadas de antigos casarões, que ainda resistem ao tempo e ao descaso, espalhadas principalmente pela parte antiga da cidade, que se situa na região central. Em muitos casos ainda se podem perceber os azulejos envelhecidos, herdados provavelmente dos migrantes portugueses que aqui aportaram. O Teatro Amazonas e o Palácio da Justiça talvez sejam os monumentos mais representativos dessa época de fausto, riqueza e encantamento que ainda permanece inalterada em sua construção original.
A criação da Zona Franca de Manaus (ZFM) e de seu distrito industrial traz para a cidade não apenas a modernidade em relação às novas formas de produção, de industrialização e de inserção do estado no Brasil e no mundo, como vai, aos poucos, fazendo com que ocorra uma mudança de comportamento e de uma óptica arquitetônica que será construída em relação às necessidades não apenas de uma população que cresce e que acaba por determinar a ocupação e o desenvolvimento do solo e do espaço social e urbano da cidade de Manaus.
Se por um lado as casas conhecidas como palafitas (geralmente construídas de madeiras e localizadas nas beiras dos rios e em áreas alagadas) são fixadas em cima de estacas de madeiras e são consideradas como solução e alternativa de moradias trazidas por pessoas que viveram no interior, por outro lado as casas flutuantes também foram e são construções alternativas de moradia na cidade de Manaus.
É a partir da década de 1960 que os grandes edifícios vão sendo pouco a pouco construídos, dando lugar a um novo panorama aos horizontes da cidade, além das casas de alvenaria e dos pequenos prédios sem elevadores.
A partir da década de 1970 as novas concepções de moradia e de modo de viver considerados modernos vão se incorporando na sociedade manauara à semelhança daqueles existentes na região Sudeste, que são os condomínios fechados que vão aos poucos se espalhando pela cidade.
Atualmente, a cidade de Manaus se defronta, à similitude das grandes cidades, com um crescimento espacial que é desorganizado e que exige por parte das autoridades e da sociedade civil constantes reflexões, uma vez que a ausência de um plano diretor faz com que esses problemas se avolumem, em consonância com as questões sociais decorrentes dos processos migratórios que foram sendo realizados ao longo dos anos.
Enfim, esse seria o quadro da situação habitacional e de como vivem os amazonenses e principalmente os manauaras. Diferentemente do que possam pensar as pessoas que não conhecem o estado e a cidade de Manaus, a ocupação dos espaços e de suas moradias seguem um padrão que em muito se assemelha às situações observadas em outras cidades brasileiras.
Por outro lado, a recente abertura de instituições de ensino de arquitetura acabará por ensejar a possibilidade de que possa surgir uma nova e diferente forma de pensar e fazer arquitetura, que venha no sentido de criar uma identidade arquitetônica urbana e amazônica, e que leve em consideração as potencialidades da criação de uma forma de vida única, somente encontrada aqui por estas bandas do rio-mar.
Carlos Perrone
é arquiteto e designer, autor de São Paulo por dentro - Um guia panorâmico de arquitetura - Ed. Senac
A moradia parece ao morador espaço criado à sua própria imagem e semelhança, casulo encomendado ou adaptado, décor de sua vida privada. Embora esse aspecto seja real e cotidiano, queira-se ou não, qualquer casa transcende seus habitantes e, arquitetura que é (bonita ou feia), fica em rua da cidade à qual pertence.
A forma de uma habitação não é casual. É produto da história do local onde ela nasceu, reverberando todas as contingências socioculturais de seu momento, não sendo imune às contaminações de valores expressos pelo "gosto". A moradia, que como propriedade é isolada, tem trocas culturais permanentes com seu meio ambiente.
Mas além de ser resultado, a arquitetura da moradia contém um projeto ou mesmo um desejo de cidade, sendo a fachada outdoor das relações dos moradores com o urbano. Esse fenômeno explicita-se quando, com o passar do tempo, desaparecem as motivações que deram origem à configuração deste ou daquele edifício que, tendo seu uso alterado, vira museu de si mesmo, vestígio espacial de seus tempos originais.
Podemos ver isso acontecendo em prédios cujas histórias confundem-se com a história do morar paulistano. Apenas citaremos nove, da região mais antiga da cidade.
1. Edifício Mackenzie, Consolação - 1894: residência dos primeiros estudantes de engenharia de São Paulo, que estavam ali fazendo parte de um projeto educacional, técnico e religioso.
2. Campos Elíseos - 1899: casa de fazendeiro no primeiro bairro que, com água encanada em lugar de chafarizes, experimentava São Paulo do século vindouro. Palacete que era, passou a ser casa de governadores.
3. Sion, Higienópolis - começo do século: moradia de freiras que escolheram, como local de sua missão educacional, as terras elevadas, onde, "longe" do centro, havia os ares mais puros.
4. FAU-Maranhão, Higienópolis - 1902: casa art-nouveau, denominada Vila Penteado, era, no princípio, residência secundária: o dono morava na fazenda, mudando-se depois para cá quando o destino da cidade anunciou-se industrial. Décadas depois, a própria família mudou totalmente o destino funcional da Vila, doando-a à USP.
5. Martinelli, centro - 1929: a mansão do comendador ficava no céu, na cobertura do mais alto edifício de concreto armado do mundo. Indicava, em sua verticalidade, o sentido de crescimento de São Paulo.
6. Casa modernista da rua Bahia, Pacaembu - 1930: seus moradores e Warchavchik, o arquiteto contratado, apostaram em uma cidade-design, afinada com as vanguardas européias.
7. Casa de Flávio de Carvalho, Cerqueira César - 1936: exemplo de casa geminada para a classe média morar modernamente.
8. Edifício Prudência, Higienópolis - 1948: os antigos moradores de casas de estilo eclético da virada do século podiam agora, desde que ricos, viver no Brasil brasileiro, inovador e original, desenhado por Rino Levi e Burle Marx.
9. Edifício Viadutos, centro - 1955: enfim a classe média já podia morar no paraíso: um "futurista" arranha-céu cor de rosa bem no centro da cidade.
As moradias paulistas atuais continuam a expressar, em sua arquitetura, padrões de relacionamento da casa com a cidade. Que projeto de cidade esconde-se nos prédios com portaria e cerca, atrás dos vidros espelhados? Nas favelas, nos casarios inacabados, nos condomínios fechados? Ainda temos projetos? Ou mesmo desejos?
Maria Lucia Malard
é professora titular do Departamento de Projetos da Escola de Arquitetura da UFMG
Durante o ciclo do ouro, a casa mineira se constituiu numa tipologia espacial e cultural que até hoje perdura. Carlos Drummond de Andrade nos revela, no poema "Morar", toda a poética da habitação em Minas. A sala de visitas assim tão selada, cheirando a santuário, os quartos, a ampla cozinha com o fogão de lenha para cozinhar a boa comida mineira. Fogão de muita fumaça e renda de picumã nos barrotes. Mais adiante Drummond explica que terá um pátio quase espanhol, como aquele da casa de Chica da Silva, em Diamantina. Além disso, há de ser por fora azul 1911. Do contrário não é casa. No quintal, há de ter uma horta de deitar no chão e possuir a terra, e de possuir o céu, quando a terra me cansa.
Foi assim que no período colonial os mineiros aprenderam a morar. Os mineiros abastados, é claro. Entretanto, os aspectos simbólicos da moradia colonial mineira impregnaram-se de tal forma no imaginário popular que, independentemente da renda que tiver, a família mineira tem um sonho: uma casa com sala de visitas contínua ao alpendre, quartos confortáveis dando para um corredor, o qual liga a sala com a copa e a cozinha. O banheiro há de ser acessado pelo corredor, longe dos olhares das visitas. Na cozinha, há de caber a família inteira proseando em volta do fogão. O tanque de lavar roupa estará sob uma pequena cobertura em mão francesa, dando para o quintal de piso cimentado, onde se possa estender a roupa para clarear ao sol. Quando o orçamento permite, a cobertura do tanque vira uma bela varanda contígua à cozinha, com toda a privacidade a que o bom mineiro tem direito. O telhado da casa tem que vir coberto por telhas de barro do tipo "capa e bica". Com forro e platibanda. A laje é uma modernidade bem aceita, porque protege da umidade nos períodos chuvosos e não deixa o ventinho frio do inverno passar pelas frestas das telhas e atravessar os cobertores. As janelas serão bonitas apenas se arrematadas em arco abatido, como as de Ouro Preto, símbolo da sofisticação mineira, presente nos casarões coloniais. Nos conjuntos habitacionais populares, o primeiro dinheirinho que sobra é para ampliar a cozinha e em seguida trocar os basculantes por janelas desse tipo, mesmo que de metal, já que se foi o tempo em que a madeira de lei era largamente empregada na região metalúrgica.
Mas Minas não é só esse coração de ferro. É também o vale do Jequitinhonha, onde os casebres de taipa ou pau-a-pique fazem a festa dos barbeiros e da terrível doença de Chagas. Lá não tem cozinha grande com fogão de lenha. O espaço é parco como a comida. Muito triste. Minas é o triângulo mineiro, com pastos e currais, fazendas e forasteiros. Bom tijolo, boa telha e muita modernidade. Influências de São Paulo. Minas é o quente vale do velho Chico, com suas casinhas colorindo as margens escuras do rio. Mangueiras, tamarineiros, umbuzeiros e goiabeiras fazem a sombra das varandas onde os moradores refrescam o úmido calor. Nada de especial no estilo das casas. Todo o encanto das cidades ribeirinhas repousa na paisagem que a corrida preguiçosa do rio São Francisco oferece aos moradores.
Minas é também o sul, com suas estâncias hidrominerais, seus bangalôs europeizados e seus hotéis neoclássicos. Os telhados são cerâmicos, mas de telhas francesas. Lá o branco predomina, na cor das casas e da pele das pessoas.
Mora-se bem em Minas? Sim, tirando-se as favelas das cidades grandes e as taperas de algumas regiões ao norte do estado. Mora-se em Minas mirando-se os rios, as montanhas e as chapadas.
Cristianne Lameirinha
é historiadora e técnica da Gerência de Estudos e Desenvolvimento do Sesc São Paulo
A função da casa é abrigar o homem, protegê-lo das intempéries e servir de espaço à sua sobrevivência, aos cuidados do corpo e do espírito. A partir do século 16, com o surgimento das idéias de privacidade e higiene, a casa incorpora aspectos da vida cotidiana que passam a acontecer longe da presença de estranhos, adquirindo um caráter velado. Inclui-se, aí, a satisfação das necessidades fisiológicas e a prática sexual; a expressão da afetividade, da religiosidade e da atividade intelectual; o convívio familiar.
Ao tratar das mudanças ocorridas na casa paulista, verifica-se que, ao longo de sua história, a cidade foi reconstruída a partir de materiais e tecnologias diferenciadas. Na cidade colonial, encontra-se a típica casa bandeirista, edificada com taipa de pilão. O binômio café-ferrovia é fundamental à substituição da cidade de taipa pela de tijolos, à qual segue-se a cidade de concreto armado, surgida com a industrialização.
Nas primeiras décadas do século 20, a cidade de São Paulo assiste à edificação de dois tipos opostos de moradia que registram, de forma veemente, o abismo social existente entre as elites dirigentes e as classes trabalhadoras: o palacete e o cortiço.
A expansão da monocultura cafeeira e o desenvolvimento da rede ferroviária alteram o perfil da cidade e das residências das classes proprietárias. Do ponto de vista social, o modelo burguês de habitação consagra o espaço da sala de visitas como o centro da casa, já que nele se concentra e se expõe a riqueza e o poder de seu dono, representados pela presença de um mobiliário importado da Europa. As residências deveriam exprimir o progresso material do proprietário, cuja preocupação com o luxo e o refinamento evidencia-se tanto no desenho das fachadas como na decoração dos interiores. Além da sala de visitas, havia o gabinete e, muitas vezes, a biblioteca, todos vinculados à sociabilidade masculina. Bem demarcadas também eram as áreas destinadas ao repouso e aos serviços, que funcionavam sob os auspícios da mulher.
Este modelo corresponde ao morar "civilizado" e "ordeiro" e associa-se diretamente a preocupações higienistas. Contrapõe-se a ele o cortiço, um dos principais focos de discussão da política urbana do período. Ao cortiço, bem como a seus moradores, vinculam-se as idéias de desordem, sujeira, doença, promiscuidade, crime e barbárie.
No entanto, o cortiço, tido como responsável pela degradação do corpo e da alma pelas autoridades políticas e sanitárias, reunia a grande massa trabalhadora formada por operários, vendedores ambulantes e até comerciantes, imigrantes e brasileiros pobres, que não dispunham de dinheiro para pagar os altos preços dos aluguéis das casas unifamiliares, onde prevalecia o modelo burguês de privacidade, garantido pela subdivisão e a demarcação dos espaços, segundo suas funções. De seus corredores centrais, abriam-se portas que davam para quartos alinhados de ambos os lados, onde famílias inteiras viviam e dormiam apertadas, sem ventilação, dividindo o espaço com insetos e roedores. A alimentação era providenciada no interior dos cômodos, mas o pátio e vaso sanitário eram áreas compartilhadas.
Essas breves observações a respeito da casa paulistana do início do século 20 indicam que o propagado crescimento da cidade de São Paulo corresponde, efetivamente, a um inchamento, cujo caráter negativo consolida-se especialmente porque o acúmulo de capital, propiciado pela economia cafeeira, não repercute na infra-estrutura urbana oferecida à população em geral: os indicadores sociais apontam para a falta de habitação e a existência de moradias de má qualidade, determinando não só o adensamento das áreas mais pobres, como o risco de epidemias. O palacete, a habitação saudável e higiênica considerada mais refinada, é o padrão escolhido pelas autoridades para a domesticação dos hábitos da população urbana pobre, que encontra nesse modelo mais um instrumento de luta pelo direito de sobrevivência.