Sesc SP

postado em 26/02/2013

A brasilidade em movimento

Temas para a dança

      


Temas para a dança brasileira, organizado pela professora Sigrid Nora, discute a relação entre dança, cultura e políticas culturais

 

Nas últimas décadas, a dança brasileira vem se firmando como uma arte de espírito livre e autônomo, capaz de fomentar pesquisas e espetáculos que têm fecundado o rico e vasto campo das artes cênicas produzidas no país. Um dos grandes responsáveis por esse desenvolvimento notável é o recente investimento na área da formação de bailarinos e coreógrafos, por meio da criação de diversos cursos de graduação em dança e da qualificação dos já profissionais, obtida em cursos de especialização e em programas de atualização.

Os movimentos voltados à criação de redes de cooperação, que fazem circular a produção nacional e internacional por intermédio de festivais e mostras, também são fatores importantes para esse processo, aliados aos esforços dos coletivos artísticos e das mobilizações em torno do aumento das condições de estímulo, em âmbito público ou privado, à produção e recepção dos bens culturais.

Entretanto, há ainda um setor vulnerável que merece atenção especial para garantir o incremento da dança brasileira no terreno da produção intelectual. Trata-se do setor editorial, para o qual uma boa bibliografia em língua portuguesa é rara, senão inexistente. É de se perguntar por que um país que viu nascer o talento de bailarinos como Márcia Haydée, Ismael Ivo e Ana Botafogo e de companhias como o Ballet Stagium, o Cisne Negro e o grupo Corpo, por exemplo, não possui uma quantidade de publicações que faça jus à riqueza de suas criações artísticas. 

Por esses motivos é que a coletânea de artigos Temas para a dança brasileira, lançada pelas Edições Sesc São Paulo, deve ser celebrada. Destinado a prestar uma sólida contribuição ao segmento editorial voltado à dança no país, o livro foi pensado como um genuíno instrumento de circulação de ideias, sem a qual as artes se isolam, esgotando suas possibilidades expressivas. Com introdução e organização da professora Sigrid Nora, Temas para a dança brasileira reúne ensaios elaborados por professores, jornalistas, bailarinos, agentes culturais, críticos e pesquisadores – todos eles profissionais comprometidos a investigar algumas boas ações de fomento à dança no Brasil e a refletir sobre elas.

Sigrid Nora, docente na Universidade de Caxias do Sul, com experiência nas áreas da dança, cultura e políticas culturais, propôs a dezessete pesquisadores a redação de artigos que discutissem temas urgentes, pautados pelas mais diversas óticas. O objetivo é o de compor uma coletânea que atenda, imediatamente, à timidez do mercado editorial e possa, em um segundo momento, servir de base para iniciativas futuras.

Os artigos foram distribuídos nos seguintes eixos temáticos: “Crítica de dança e jornalismo cultural”, “Dramaturgia e dança: tendências estéticas e processo de criação”, “Produção em dança: especificidades de um ofício” e “Estratégias de colaboração para a dança no Brasil”. Ao discutir a dança sob enfoques plurais, cada um dos textos procura criar possibilidades de intersecção que teçam outras tramas, propiciando informações de qualidade e gerando densas reflexões.

Na parte que trata do jornalismo cultural, valem dois destaques. Beatriz Cerbino (professora da Universidade Federal Fluminense) põe-se a pensar sobre o papel do crítico nas discussões geradas por um espetáculo de dança, apresentando as diferentes perspectivas e os variados tipos de escrita que a crítica da área vem assumindo, em especial no Rio de Janeiro e em São Paulo. Por sua vez, Nani Rubin (editora-assistente do Segundo Caderno do jornal O Globo) analisa o espaço dedicado à dança no suplemento cultural em que trabalha e as razões pelas quais o tema ocupa, em comparação às demais áreas artísticas, poucas capas de cadernos de cultura nos grandes jornais.

No eixo voltado à dramaturgia, a dramaturgista Fátima Saad apresenta a função desse profissional ainda pouco conhecido, relatando a origem da função e sua relação com o surgimento do conceito de encenação teatral, enquanto Sílvia Soter, crítica de dança de O Globo, descreve sua prática de dramaturgista junto à Lia Rodrigues Companhia de Danças, atividade que desenvolve desde 2002.

Na seção sobre a produção em dança, cabem dois registros. A jornalista especializada em dança Adriana Pavlova descreve sua recente pesquisa dedicada ao trabalho dos principais produtores brasileiros responsáveis pelas apresentações de companhias internacionais nos palcos do país, a partir dos anos 1980. Já o consultor e programador cultural João Carlos Couto apresenta um panorama da produção na área das artes cênicas a partir dos anos 1970. Seu texto, “Produção/programação: um desafio constante”, examina os fatores determinantes para o sucesso de uma iniciativa.

Encerram o livro cinco artigos sobre estratégias de colaboração. A coreógrafa Andréa Bardawil sugere aos que se dedicam à dança permanecer em constante “estado de invenção”. A professora Nirvana Marinho examina a criação de coletivos de artistas no contexto da dança contemporânea praticada na última década. O pesquisador Marcos Bragato estuda a cultura à luz do darwinismo, do sexo, do comportamento e da dança, afirmando que uma prática cultural necessita de regularidade ambiental e de mecanismos reforçadores e motivadores. A crítica Rosa Primo mapeia as principais mostras e festivais brasileiros que ocorrem fora do eixo Rio-São Paulo. Por fim, as assistentes técnicas do Sesc São Paulo, Simone Avancini e Marina Guzzo, tratam dos conceitos de difusão, circulação e mediação que norteiam a atuação da instituição no segmento da dança.   

Nas incontáveis interações temáticas propostas nos textos do livro, tanto o leitor especializado como o leigo poderão refletir sobre um mundo em movimento, plasmado por uma linguagem artística que acompanha o homem desde a aurora dos tempos. Cada um dos autores desta iniciativa pioneira aborda a dança como uma ação histórica, política e, por vezes, militante – o que já garante a Temas para a dança brasileira um potencial transformador.
 

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