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postado em 10/03/2016

O (a) “cara” da capa

Imagem a partir do fac-símile da capa de Cangaceiros. José Lins do Rego. José Olympio Editora, 1953
Imagem a partir do fac-símile da capa de Cangaceiros. José Lins do Rego. José Olympio Editora, 1953

      


Capas de Santa Rosa, de Luís Bueno, traz mais de trezentas capas feitas pelo mestre paraibano e revela sua sintonia com o momento editorial, literário e social brasileiro

Por Ubiratan Machado*

 

Em 2016 o Brasil comemora sessenta anos da morte de Tomás Santa Rosa, ocorrida na Índia. Foi uma espécie de sarcasmo do destino, o homem pacato e jovem (ainda não tinha 50 anos) e o artista brasileiríssimo morrer longe, muito longe, da terra e das criaturas que seu desenho fixou com angústia, simpatia pelos humildes, dramaticidade, comoção, uma certa carga elétrica de poesia. Eletricidade. Talvez seja essa a palavra-chave para definir o homem e o artista, os vários homens e artistas que coabitavam sob a sua pele de nordestino arretado. Pois Santa Rosa, como todo criador autêntico, foi muitos. Talvez, não tenha chegado a ser trezentos ou trezentos e cinquenta como admitia Mário de Andrade, cheio de espanto, ao olhar para si mesmo. Talvez. Mas foi múltiplo, sobretudo em sua atividade profissional. Pintor, diagramador, cenógrafo, ilustrador de revistas e livros, escritor que gostava de derramar o leite da ternura humana no coração e na mente da criançada (vejam o seu delicioso O circo, vencedor do concurso de obras infantis do Ministério da Educação), decorador, figurinista, crítico de arte e mais uma meia dúzia de atividades menores. Mas, tudo pesado, ele vai ficar mesmo como o grande responsável pelo fiat lux que iluminou e modernizou o livro brasileiro.

Quando ingressa na editora José Olympio, em 1934, Santa Rosa passa a atuar como paginador, diagramador, ilustrador, capista. Só o texto não era dele.

No mais, executava tudo quanto a musa canta a respeito. Essa atividade, com crises periódicas de autorrenovação, durou mais de vinte anos. Durante esse período, as edições da Casa (como se dizia então da José Olympio) ganham corpo e cara próprias, e, por tabela, renovam o livro nacional, dando-lhe aspecto e espírito brasileiro. Por “cara”, entenda-se a capa do livro, atividade na qual o artista gráfico Santa Rosa pôs o máximo de si mesmo.

Nada disso é novidade. Essa história já foi contada em livros, ensaios e artigos de imprensa, mas faltava alguém com paciência de Jó e gosto pela pesquisa para levantar as trezentas e tantas capas desenhadas e diagramadas pelo mestre paraibano, analisá-las, virá-las pelo avesso, colocá-las em sequência cronológica, mostrando as muitas singularidades do artista e sua evolução em sintonia com o momento editorial, literário e social escaldante então vivido pelo Brasil. Esta é a novidade deste Capas de Santa Rosa, de Luís Bueno, fruto de dez anos de trabalho persistente.

Com paixão, isenção e aguçado olho crítico, Bueno acompanha a trajetória do capista e sua intensa atividade, movida a eletricidade, como observamos. Capaz de sondar o espírito de uma obra e representá-lo em uma ilustração no espaço de uma noite. E... bem, não vamos adiantar mais nada. O melhor é o leitor acompanhar o próprio texto do autor. É fácil. Basta abrir o livro e pular para dentro de suas páginas, enriquecidas com a reprodução de centenas de capas de Santa Rosa e de alguns contemporâneos. Essa é a melhor homenagem que se pode prestar ao artista, nos sessenta anos de sua morte.

 


*Ubiratan Machado é jornalista, tradutor, ensaísta e biógrafo. Tem trinta livros publicados, entre os quais A vida literária no Brasil durante o romantismo, Pequeno guia histórico das livrarias brasileiras, Dicionário de Machado de Assis História das livrarias cariocas. Este texto foi originalmente publicado na orelha do livro.

 

Veja também:

:: Revista E | Livro mapeia produção de Tomás Santa Rosa, cujo trabalho se destaca em áreas como design editorial e cenografia para teatro

O Estado de Minas | Livro traz o melhor de Santa Rosa Júnior, um dos grandes nomes do modernismo
Capas de Santa Rosa, do pesquisador Luís Bueno, reúne trabalhos do ilustrador e designer gráfico que marcou época. Por Carolina Braga

 

:: Trechos do livro

 

 

 

 

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